quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Eu prefiro

 
"Prefiram sempre a vida e afirmem incessantemente a sobrevivência..."
Jacques Derrida

no fim de ano, acho bonita a vontade de recomeço que toma conta das pessoas. porque, afinal, a simbologia está por toda parte em nossa vida. a diferença é que, nesta época do ano, estamos mais abertos. daí, vêm os desejos. e as tentativas de recomeço. e um não-querer fazer nada a não ser se entregar às miudezas. há um sem-fim de coisas que eu gostaria de fazer nos próximos dias. viagens, umas dez. mas como não deu, tenho mergulhado nos desejos possíveis. e estou entregue a eles.

nestes dias, se as escolhas fossem somente minhas, não sairia de casa. veria o mundo só pela janela. e deixaria o corpo pesar num filme depois do outro, num livro depois de outro. porque num livro depois de outro, num filme depois de outro, encontro muito facilmente o que sinto ser a felicidade. e não. não foi isso que fiz ao longo do ano. trabalhei muito. uma tarefa depois da outra e da outra e da outra, daí a vontade de adentrar num tempo mais lento, num ritmo mais subjetivo, como se nesse tempo, nesse ritmo, estivesse a pessoa que eu gosto ou gostaria de ser. sinto que minhas fatias estão espalhadas ao longo do dia, o que invariavelmente me faz pensar que tem horas que a vida é apenas triste mesmo. e ponto.

entretanto nada me parece mais acertado do que, estando na vida, ser pela vida que temos de batalhar. há muita densidade em algumas almas tristes (ainda que boa parte, parece-me, apenas chafurdem na lama de suas vidas medíocres), mas também acredito muito naquelas pessoas que tentam suplantar suas almas tristes por meio de um contínuo pensar sobre a própria vida, reinventando-a a cada vez que parece haver barreiras intransponíveis. quero crer que sou uma dessas gentes. atravessei longas distâncias e todas as vezes que, por causa delas ou por outras que surgem, pareço me distanciar do "contrato" que fiz comigo mesma há mais de dez anos - um contrato de alegria e cuidado -, retorno aos dias das enormes distâncias para descobrir que, ali, não é o lugar que quero ficar.

assim, ao contrário de Bartleby, que continuamente preferiu dizer não, até sucumbir encostado em seus muros intransponíveis, eu prefiro afirmar incessantemente a vida e a sobrevivência, e por causa da experiência de quase-morte pela qual já passei,  desconfio que o farei sempre, até mesmo na hora da morte e no além-morte, se este houver, como fez Derrida, que escreveu seu próprio epitáfio, do qual transcrevi a epígrafe deste texto, reafirmando a vida. porque se não for para afirmar constantemente as inúmeras possibilidades da vida, de que adiantaria estar aqui? estar aqui é já um ser-aqui. bem-ser é, assim, uma magnífica oportunidade que nos damos de não sentarmos em cima de nossas risíveis "mini-certezas". preferir. e fazer disso não o lugar a ser alcançado. mas o caminho. a travessia. a deriva. derivar, para Derrida, é uma palavra imprecisa, mas que permite inúmeras possibilidades. é isto, não?
*
*
* e depois de muita "guerra" com a que outrora foi a máquina de meus sonhos, o jeito foi desistir dela e trocá-la por outra, que ando experimentando por estes dias. tirei esta foto com o carro em movimento, mas achei bem bonita a imagem descentrada do caminho.

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Querido Papai Noel

Querido Papai Noel:
Muito obrigada por 2013. Obrigada pelo final de Dexter, The Office, Breaking Bad, por How I Met Your Mother, pelo carro, pelo AliExpress, pela Black Friday e pelo Ted. Muito obrigada mesmo!
Quanto aos meus pedidos, por favor considere a carta que enviei o ano passado. Meus desejos continuam os mesmos e não entendo porque eles não se realizaram: eu fui uma excelente menina. Doei sangue, rezei, dormi cedo, ajudei as crianças e tentei não julgar ninguém.
Não sei se foi coisa sua, mas demitir a ex-chefe que me atormentava não me deixou feliz (Emily Thorne que me perdoe). Eu só queria sair daquela empresa, e você me atendeu. Obrigada, apesar de não ser exatamente a vaga dos meus sonhos adoro onde estou. Por favor, permita que eu seja monitora lá esse ano. Prometo ser boazinha.
Finalmente consegui emagrecer, mas engordei de novo. O senhor também tem problema com o peso e deve saber como sofro para encontrar uma roupa. Por favor mantenha minha casa fora da área de entrega do Habib´s e do Burguer King e faça abrir um sacolão no Mc Donalds da frente do meu prédio.
Mais uma vez agradeço por tudo,
Camila

PS 1. Não vai adiantar você dizer que você não existe. Minha mãe disse que você existe e minha mãe não mente. 
PS 2. Por favor não me obrigue a pedir as mesmas coisas no ano que vem. 

domingo, 22 de dezembro de 2013

De como deixei de acreditar em Papai Noel

Não, "acreditar" não é a palavra. Isso porque eu jamais coloquei em dúvida sua existência. Para mim o Papai Noel existia, assim como minha mãe existia e assim como eu próprio existo. Não era o tipo de coisa que dependia de algum tipo de crença. Ele não existia. Ele ERA.

Era todo ano a mesma coisa. Conforme os ponteiros do relógio iam se aproximando da meia-noite, os adultos, devidamente mancomunados, iam trocando olhares suspeitos. Como ninguém em minha casa tinha fantasia de Papai Noel, os ardilosos mandavam minha irmã e eu nos escondermos no banheiro "já que o Papai Noel teria uma longa noite pela frente e não tinha tempo de cumprimentar cada criança de cada casa"- diziam. 

Até hoje não entendo como este argumento mequetrefe nos convencia: lá íamos nós, com o coração aos pulos e a curiosidade nas alturas, nos trancar no pequeno banheiro dos fundos. De repente uma campainha tocava (sim, os malandros pensavam em tudo e sim, minha casa não tinha chaminé), uma conversa era forjada entre os adultos e o Papai Noel (sim, ele não tinha tempo para cumprimentar crianças, mas ficava de papo furado com os adultos. Velho hipócrita!). De repente, um murmurinho indefinido e um silêncio. Daí, alguém mandava nos chamar! Atravessávamos a casa antes de alguém conseguir dizer "ho ho ho" e lá estavam os presentes que o velhinho gorducho nos deixara (os melindrosos ainda tinham a sutileza de deixar um copo de refrigerante pela metade, para simular que alguém muito apressado o bebericara).

A farsa deu certo por 7 anos. 

No início do oitavo, o SBT estreava o programa dominical Hot Hot Hot, apesentado por Silvio Santos. Este fato, aparentemente inocente, transformaria para sempre os hábitos natalinos de minha família. Numa certa ocasião, em uma atração voltada para crianças, Silvio Santos entrevistava o ator-mirim que interpretava Julinho em Éramos Seis (a melhor telenovela de todos os tempos, segundo meu próprio julgamento e sim, minha família assistia muito SBT naquele tempo). Papo vai, papo vem, até que o proprietário-apresentador pergunta: "Má oi, Julinhoam, hihi, oi, vem pra cá, quando você deixou de acreditar em Papai Noel?".

Um filme se passou na minha cabeça em questão de segundos. O banheiro. A campainha. O refrigerante.

A verdade veio à tona. Me senti como Truman (em "O Show de Truman. O show da Vida"), quando seu barco se chocou no cenário que era seu mundo.

E foi assim que deixei de acreditar em Papai Noel e passei a acreditar em Silvio Santos.


***

Retrospectiva dos dias 22 em 2013



sábado, 21 de dezembro de 2013

Partindo. Sem rumo. Uma certeza.

Resolveu juntar as lembranças que ainda restavam, e colocar tudo na bolsa.
Não tinha mais por quê juntar tanta coisa. Tanta coisa que parecia tão importante...
E ao final das contas, percebeu que havia dissipado.

Não.
Não precisava mais juntar teias de aranha em ideias que julgava serem novas.
Coisas que envelheceram, que perderam o brilho, havia muito tempo, mas que só agora ela começou a notar.

Tempo de recomeçar.
No novo rumo, no novo caminho, pra onde iria, e do jeito que iria, ia poupar espaço pro que realmente era importante. Pra quem realmente era importante.
Pra quem ganhava importância.

Isto posto, hora de checar as malas.
Tava tudo ali.

Tanto tempo se passou. A idade já não era a mesma. Nem o tempo.
Tudo mudou. Só ela não percebeu.
Mas ainda era tempo.
Bastava organizar tudo no seu devido lugar.

Quando se joga o lixo da despensa, o vazio da limpeza tende a ser melancólico, mas com o tempo se acostuma.
E deveria ver aquele vazio como nova oportunidade de encher com o novo que haveria de vir. Sim. Quer acreditar nisso, e por isso realizou a faxina.

Uma ultima olhada pra casinha que tanto tempo amou. Lugar que trazia segurança, aconchego... Mas que agora significava um passado distante, que ficava para trás...

Que precisava ficar pra trás, ainda que ela não quisesse assim...

Liga o carro. Olha pra frente.
Novos horizontes, novas realidades, novas histórias.
O que vinha, valeria a pena.
O que vier, haverá de valer.

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Ah... não precisava!

Em Campinas, no Centro de Convivência, todos os fins de semana tem a feira hippie. Existe há mais de 40 anos. Já mudou de nome, agora oficialmente é feira de artesanato. Justo, afinal, fundada por hippies foi aos poucos ganhando barracas fixas e ultimamente vemos apenas um ou outro ‘neohippie’ sentado em algum canto para vender seus trabalhos. De hippie mesmo restou somente o apelido da feira de artesanato.

Há alguns anos eu queria presentear uma pessoa com um par de brincos. Fiz o esboço do que queria em um papel e fui até a feira e mostrei a um bicho-grilo, que com um alicate de bico e um pedaço de arame foi moldando minha ideia enquanto conversávamos.

Não lembro como chegamos a falar de pirataria, mas ele comentou, bem humorado, que deveriam combater a pirataria contra os hippies, pois estavam chegando produtos da China imitando a indumentária artesanal, trocando sementes, penas, pedras por similares de plástico.

Este ano novamente eu tive a intenção de um presente mais personalizado. Diferente da última vez, não sabia bem o que queria, mas tive a ideia de ir até a feira, imaginando que em uma ‘feira de artesanato’ haveria ao menos algum produto manufaturado, portanto original.

Nunca havia reparado que a feira hippie, que passou para feira de artesanato por não ter mais hippies, também não tem mais artesanato. Roupas, colares, brincos, pulseiras, os itens de sempre, porém tudo industrializado.

Não quero cair na armadilha do saudosismo e dizer que no início essas feiras – suponho que essa industrialização tenha se espalhado por todas do mesmo estilo – eram melhores. Mas isso me fez pensar no que significa um presente, que foi para mim a origem de toda essa história.

Variando de pessoa para pessoa, alguns acham que presente tem que ser caro, outros que deve ser uma coisa necessária, às vezes associam à utilidade. Uma definição interessante que encontrei é que presente ideal é o que a pessoa não sabia que desejava – ótima, mas que faz da escolha de um presente a tarefa mais difícil do mundo.

Diria que um presente tem que ser marcante. Não precisa ser caro, nem necessário ou útil. Poderia ser um guardanapo rabiscado em uma mesa de bar, por isso considero que quando o presente é um livro, o mais importante é a dedicatória.

Enfim, como a definição de um bom presente é variável, nessa época do ano as pessoas aproveitam para colocar em prática o verdadeiro espírito do Natal: ir às compras gastando tudo e mais um pouco com presentes que muitas vezes não vão agradar.

Este comportamento típico está relacionado à industrialização, não das quinquilharias hippies, mas da sociedade como um todo. A produção em massa abastece o comportamento padronizado de quem vive a vida como uma linha de produção. Não há espaço para originalidade. Consumir. Consumir o mesmo. Consumir o mesmo ao máximo.


quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Milton, O Alter-ego do poeta que nunca existiu.

Milton acorda. Uff, estou vivo. Aqui estão  as mãos, as pernas, enxergo bem, respiro, aqui o meu pau rosa, minha pinta oculta. Está vivo, confere? VIVO!
Milton acordou pensando em poesia. A orgia no sonho o deixou inspirado. Mas sonhos não se contam, nem para terapeutas nem para leitores. Sonho é meu, somente, eu.
Milton é como eu mesmo. Nasceu no dia que aquela bruxa disfarçada de escritora jogou no lixo minhas poesias, quase literalmente. Nem eu nem Milton ficamos bravos, estávamos suficientemente entretidos em olhar pela fresta entre a saia curta e as pernas da bruxa A bruxa nunca me quis e o Milton se vingou dela.Gracias Milton por ser tão valente, negar-se a uma mulher é um dom concedido só aos alter-ego. Homens não poderiam fazer isso, vá contra as leis que ditam o fluxo do humano.
Então Milton espreguiça o corpo e sente a mulher perto dele. Milton gosta de dormir acompanhado, mesmo que o espaço no colchão fique pouco para dois corpos lado-a-lado. A pele dela é lençol de seda, crispa no tato quente do Milton. Eu fico na inveja e assopro no ouvido dele o desejo contido do meu ventre. Quero mais, Milton, você tem que querer sempre mais. Mas alter-ego não tem essa de querer mais, só quer aquilo mesmo: fémea, movimento avulso do corpo, suor, algo de raiva e gozo, muito gozo.
Milton não serve para escrever. Ele vive somente com sonhos e é feliz assim.
Passa a mão na menina que respira delicadamente sobre o rosto dele. Um tesão do caralho. Um tsunami ventando nas janelas. A fome dos dez desertos do celibato. Não aguenta, e entorta o corpo à procura de todos os cheiros.Para Milton – e para mim – não há vida sem cheiro. O que não cheira, não vida!
E assim fica, ele cheirando aquela vida toda dentro da menina, dormida e cúmplice, e eu, poeta morto escrevendo a vida que ele vive.
se quer saber mais sobre esse tal do Milton, segue o link > http://entreduaslinguas.wordpress.com/tag/milton/

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

7 motivos para odiar almoços coletivos

Almoços coletivos podem ser definidos como uma galera que tem a feliz ideia de almoçar junta para criar tumulto comemorar alguma coisa. É muito comum nesta época do ano, em que todo mundo quer reavivar o espírito natalino, a partilha, a união. Se usa muito na firma, nas turmas de pilates, nos grupos de oração, nas turmas de 10 anos de formados. Tem também na modalidade: jantares coletivos. Ao receber convite para esses eventos, fuja fique atento:

1. Onde comer
O problema com o lugar começa com a reserva. Os restaurantes odeiam almoços coletivos e, por isso, costumam dificultá-los. Poucos lugares estão preparados para comportar esse tanto de gente (QUE INSISTE EM SENTAR NA MESMA MESA GIGANTE, falemos já disso). Há lugares que não fazem reserva, ou, quando fazem, torcem o nariz se metade do grupo ainda não chegou no horário marcado. Atenção: toda essa revolta marcará o atendimento para sempre.

2. A diagramação das mesas
Deus é onipresente. Você não. Partindo do princípio que somente um corpo pode ocupar o mesmo lugar no espaço e de que o ambiente não é rotativo (não inventem almoços coletivos com lugares rotativos, porfa, isso não é uma ideia), você vai conversar no máximo com 6 pessoas – que consistem nas duas ao seu lado, nas três em sua frente e o garçom, isso se não tiver música ao vivo e em alto volume. Se esse for o caso, fique feliz de conseguir conversar apenas com o garçom. A questão é simples: NÃO PRECISA SENTAR TODO MUNDO NA MESMA MESA! Isso não dá a ideia de união, isso desestabiliza o restaurante todo, chama a atenção, faz as demais pessoas odiarem vocês, etc.

3. Ninguém é bem atendido
É importante saber que, numa mesa de almoço coletivo, o garçom está puto. Note bem quando ele só aparece no momento em que todo mundo teoricamente já tem seu pedido e ele fica meio sem paciência quando as pessoas titubeiam (já que ele pediu pra todo mundo se decidir antes de começar a anotar!). Não abuse da paciência de quem pode cuspir/escarrar/colocar catota no seu prato. Saiba que pedir para ele tirar fotos (e só mais umas 5 vezes porque eu não fiquei ‘boa’) vai contribuir para o brinde.

4. Nada vem certo
É difícil as pessoas entenderem o significado de simplicidade. Em um almoço coletivo, isso é quase impossível. Em uma turma de 30 pessoas, é comum 98% não se limitarem às opções do cardápio e pedirem coisas como: um filé de frango com as bordas levemente tostadas e essa salada que acompanha não pode ser batatas fritas no lugar e aí pode trocar esse molho de ervas por um barbecue? E me vê um suco de manga, mas com hortelã, uma rodela de abacaxi, água gaseificada e sem manga, obrigada? Mano, fique feliz se beber apenas xixi.

5. É uma zona
Ficamos de acordo que ninguém conversa com ninguém (reler ponto 2). Mas acontece que não é só isso. Em um ambiente coletivo, os instintos primitivos se exaltam, os perfis caricatos ficam mais aparentes. A piriguete se joga em cima do chefe, animada pelo licor de papaya na entrada, a mulher do chefe se emputece, a loirinha do RH solta aquela gafe máster deixando escapar coisas sobre demissões, tem sempre alguém gritando mais que o tio da pamonha, alguém batendo palma querendo botar ordem, o funcionário novo se esforçando para puxar saco. Nesse samba de criolo doido, ganha mais quem não foi é invísivel.

6. A conta
A hora de dividir a conta é um exímio paradoxo. A divisão por igual facilita a vida, mas é a treva da injustiça. O estagiário pediu omelete sem queijo e engoliu a seco, para economizar o VR, e no final acaba pagando 50tão, subtraído desonestamente pelo arrojo dos mais requintados, ou espertinhos, que pediram banquete já se ligando na conta dividida (os garçons, querendo ver o circo pegar fogo, já trazem a divisão per capita na própria folhinha da conta e estimulam esse pagamento, pra fuder com tudo facilitar a vida deles). Por outro lado, o pagamento de ipsis litteris do que você comeu é um atentado à lógica, emputece ainda mais os garçons, ninguém calcula os 10% e, no final, o último a pagar é sempre o Souza, aquele tio do almoxarifado que nunca liga de pagar a mais, mas antes de aposentar ainda pode fuzilar geral com uma escopeta pelos anos de injustiça cometida ao seu bolso nos almoços coletivos.

7. O Parabéns/O Amigo Secreto/O Discurso
São momentos constrangedores. Ponto. Ninguém precisa disso. Nem as outras mesas precisam escutar que ‘Soninha é uma guerreira, que fará falta’, ou que ‘É só uma lembrancinha, pode trocar se não servir’. As caras de tacho diante do presente, ou a moleza de quem canta parabéns odiando o aniversariante, tudo isso está sendo flagrado por mesas alheias, pelos garçons, pelas câmeras do Juízo Final.

*foto ilustrativa. Diz que é a tentativa de almoço recorde na Austrália, com 5 mil pessoas. Corra pras montanhas.

Por fim.
O almoço coletivo é um grande zoológico. Apelo: não compareçamos. Se cada um fizer a sua parte, eles acabam por falta de quórum.

domingo, 15 de dezembro de 2013

Só quando evaporar

Revendo alguns textos meus, buscando sobre o que escrever no dia de hoje, concluí que meu combustível literário é a  insatisfação, a insegurança, a tristeza e a indignação. Acho que meu copo precisa estar meio vazio para eu me motivar a escrever. É por isso que hoje eu nem vou me dar ao trabalho.

sábado, 14 de dezembro de 2013

Texto-Imagem


Biblioteca queimando.
Barcos ancorados na beira de um rio.
Pássaros empoleirados em uma árvore com galhos finos e secos.
Calda de chocolate borbulhando na panela.
Um casal de velhos tomando café enquanto assistem tv.
Gotas de chuva caindo no asfalto quente.
Um trem que passa na frente de uma plantação de soja.
Um homem magro e alto observa a lua.
Penas de um pássaro que foi capturado por um gato.
Um carro em alta velocidade atravessando uma ponte.
Um vestido que se desprende do varal e sai voando.
Formigas carregando pedaços de folhas verdes.
Uma mulher cata piolhos em crianças.
Uma pessoa anda no corredor solitário de um hospital.
Uma flor roxa que nasce dentro de outra flor lilás.
Um envelope fechado jogado por debaixo da porta.
A água escorrendo fria das pedras de uma cachoeira.
As brasas vermelhas de uma fogueira quase apagada.
Pegadas na areia molhada da praia.
Pessoas dentro de um elevador.
Cacos de vidro espalhados pela calçada.
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Quando pensei no que escrever para essa minha postagem no blog não veio ideias, vieram imagens de tudo quanto é tipo: coisas, pessoas, animais, lugares e em tempos diferentes. Pensei no quanto um texto pode ser desconectado, fragmentado e não ter a pretensão de dizer algo objetivo. Dadaísta talvez. E aí está! Para mim foi como um exercício que eu nunca imaginei que me permitiria fazer. Foi até terapêutico. E é só! 

Bom final de ano para todos nós e que 2014 seja um ano repleto de criatividade! :-) 

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

A filha ingrata

Apesar de ter nascido em São Paulo não consigo morrer de amores pela cidade, me sinto como aquela filha ingrata que rejeita a mãe.

E quando os dias são quentes, como estes que passo agora, então viro aquela filha de novela mexicana, com sangue nos olhos, louca para ir embora.
 No frio até disfarço minhas emoções turvas, mas no calor me pergunto, existe alguma qualidade de vida aqui? Não tem água por perto, nem bons parques e as ruas cheiram mal.

E sempre tem algum paulista para me dizer - Mas você sempre pode ir para a praia, fica perto!

O que? Ferver oito horas em um carro e chegar em uma praia suja e lotada, sem nenhuma infraestrutura?

Existem cidades no mundo que não precisam de justificativa nem razões, estar ali faz bem a alma, mas para morar em São Paulo a pessoa precisa ter essa lista preenchida, porque nada justifica morar em uma cidade tão cheia, suja e sem qualidade de vida.

Fui fazer minha lista e fiquei chocada. São Paulo é um ponto de referência para quem quer estudar, eu já passei dessa fase, para quem trabalha em grandes empresas também é importante estar aqui, não é meu caso, meus amigos já voaram daqui há tempos e não tenho um amor nesta selva de concreto, conclui então que estou perdendo meu tempo e gastando minha pele em uma cidade que não precisa de mim nem eu dela.

Um amigo tentou argumentar, aqui é uma cidade de eventos culturais importante, o centro do país e com enormes livrarias.

Mas eu não frequento eventos culturais porque é outra coisa na cidade que me tira  do sério, lugares cheios e muita confusão. Quanto as livrarias hoje existem as compras online, posso comprar até lantejoula da vinte e cinco de março na página virtual das lojas.
A única coisa que eu poderia considerar seria a gastronomia, mas como vivo de dieta não posso nem desfrutar disso.

Paulistas amam São Paulo, gostam de andar de bicicleta respirando o ar poluído pelos carros, adoram ficar três horas na fila de um evento, levar oito horas para chegar a praia, frequentar parques que não tem nem banheiro e pagar caro por tudo isso.

Sou oficialmente a filha ingrata, não gosto daqui. E começo a desconfiar que minha personalidade vem de ter nascido aqui, já cheguei reclamando, deve ser isso. Freud poderia explicar, mas é apenas mais um caso de uma mãe e de uma filha que não morrem de amores uma pela outra.

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Insônia

Estava ali, exercendo a insônia, no silêncio da noite, no escuro do quarto, pensando no que a vida já me proporcionou e analisando o que poderia ainda proporcionar.

Contava os segundos na cabeça, o tic-tac do relógio ficava por conta de meus dedos tamborilando sobre minha barriga.

Nada. Ainda exercendo-a.

Até que a chuva veio, cantou no telhado da casa vizinha a canção que me faltava. Cantou e ao me ver encantado, convidou-me a dormir.

Boa noite.

Dormi que nem vi. Quando acordei já era dia e a chuva já tinha partido.


Encontre mais no livro Rascunhos Vivos

domingo, 8 de dezembro de 2013

Mais uma Lição de Vida.


Se você precisa de uma história de um rapaz sem os pés e braços, e que mesmo assim tem uma boa vida.
  (antes trabalhavam no circo, agora só tem que ser exemplos de superação!)

  Se quando vê pessoas sofrendo e passando fome, consegue dá valor a sua vida.
 (um pouco de desgraça sempre anima o dia.)
   
  Se você posta fotos de lindas crianças negras, e coloca : quem não tem preconceito curte aí.
  (afinal preconceito é só com negros, "tá serto!")

  Se você vem ameaçando, do tipo: se ama compartilhe se odeia fica só olhando.
  (...)  

  Se você avisa que não vai "vim" amanhã.
  (...x2)

  Se você não percebe o tamanho da ironia.
  Nem vou explicar, 
                                    por que não gosto de você.

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Quadrilha digital

João curtia Teresa que cutucava Raimundo que mandava mensagem in box para Maria que compartilhava com Lili que não bloqueava ninguém. 

(Cleyton Cabral)

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

4 de dezembro.



O dia passou e eu não vi. Estava ali, como as borboletas que não cristalizaram suas asas ao saírem das crisálidas. Mas eu não estava.

*

O dia passou e eu não ri. Estava ali, com os meio-sorrisos de entendimentos entre os amantes que não podem confirmar suas preces. Mas eu não estava.

*

O dia passou e eu não lembrei. Estava ali, com as memórias alfarrábicas dos aniversários nacituros. 
Mas eu, eu não estava.

*

Agora voltei.

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

É porque eu me lembro bem

Hoje um menino de 12 anos morreu baleado em nossa cidade. Em nossa linda cidade. Não foi na distante Rio de Janeiro, nem na fria São Paulo, foi bem aqui, no nosso nariz, em Poços de Caldas. Precisei ler a matéria umas cinco vezes para ter certeza que não era um erro. Talvez um menino nascido aqui mas que agora morava em alguma cidade violenta, mas não, foi aqui mesmo. Ironicamente ou não, na Serra de São Domingos, aos pés do Cristo Redentor.

Estava com outros dois adolescentes ( 18 e 19 anos) em um carro furtado, houve uma perseguição policial, tiros e o menino foi atingido. Um menino com problemas com droga, um menino com encaminhamentos para o conselho tutelar, com passagens pela polícia, mas um menino.

É estranho assimilar um currículo tão pesado com a palavra criança, mas era isso que ele era, uma criança de 12 anos. Tão cheio de dúvidas  e inseguranças quanto o seu filho da mesma idade é,  quanto eu e você fomos um dia, portanto,  ouvir você defender uma atrocidade dessas,  ouvir você dizer que é um bandidinho a menos,  não me faz querer discutir quem é a culpa, se é da polícia, se é do sistema de educação ou saúde do país. Pra mim a pergunta aqui é outra. A pergunta é: você se lembra de você com 12 anos?