sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Depois daquele beijo

E começa mais um ano eleitoral! E antes que os cientistas políticos apareçam nas redes sociais e o arranca-rabo comece a ficar mais sério, vou aproveitar o clima politicamente ameno de Janeiro para falar-lhes um pouco de algo sobre o qual eu costumo ser muito questionado nas ruas e em eventos sociais para o qual sou costumeiramente convidado: minha trajetória política. Quem conhece minha ampla participação nos movimentos sociais e minha constante e contundente preocupação com as questões que afligem a polis, logo me indaga acerca de minhas influências militantes, de meu berço revolucionário. Bom, não gosto de me gabar, mas saibam que tudo começou com um beijo..

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O bairro inteiro estava em estado de grandiosa excitação. As equipes de rádio e TV chegaram cedo para cobrir o evento do século. Donas de casa davam entrevistas, comerciantes comerciavam, e crianças como eu se espremiam como podiam para serem captados pela TV. O orgulho era imenso, afinal, o prefeito em pessoa estaria em nossa humilde quebrada para a inauguração de seu revolucionário conjunto habitacional de influência asiática. Não sei quanto tempo ficamos esperando debaixo do sol, mas o fato é que o prefeito de fato apareceu, em carne e osso, bem na nossa frente. E, para minha mais estupefata surpresa, ele veio chegando em minha direção, postou-se ao meu lado e beijou-me calidamente a face direita, enquanto os fotógrafos davam os cliques que estampariam os jornais do dia seguinte. Os mesmos lábios que falaram “estupra, mas não mata”, que falaram “professora não é mal paga, é mal casada”, foram os lábios que me tocaram calidamente a face direita diante das câmaras de TV. Sim, Felipe Lários afirma: “Já fui beijado por Paulo Malluf”.

Por favor, não me levem a mal. Hoje eu me envergonho muito desse desditoso dia e foi só depois de muita terapia que tive a coragem de vir a público compartilhar isso com vocês. Eu preferia vir aqui e falar que eu era a garotinha que se negou a cumprimentar o Figueiredo ou mesmo o homem que se recusou a fazer a saudação nazista. Tudo era melhor do que ser o garotinho que quase se engalfinhou com outros meninos e meninas para receber um beijo do Malluf, o diferentão, o “rouba, mas faz”, “o Rota na Rua”, o tio Patinhas da Suiça. Entretanto, naquele tempo era diferente. Naquele tempo, eu me sentia o menino escolhido, o Eleito, o aliado do Paulo. Pensei comigo, se o cara confia tanto assim em mim, eu preciso cooperar!

Foi por isso que no ano seguinte eu militei pra valer! Como ainda não existia a reeleição, Malluf precisava fazer um sucessor, um braço direito, um aliado. Seu nome era Celso Pitta, que logo passou a ser também meu braço direito, meu aliado! “Se o Pitta não for um bom prefeito, nunca mais votem em mim”, dizia o Paulo na TV. E lá ia eu tentando convencer minha avó, mãe, tio e irmãos a votarem no sucessor do Paulo.  



Muitos anos se passaram desde o dia em que saí correndo pela rua comemorando a vitória de Pitta como quem comemorava um gol. O Pitta, afinal, não foi um bom prefeito e eu nunca mais votei no Malluf. Eu até pensei que o espírito malufista estava de volta, reencarnado na figura de José Luiz Datena, mas foi alarme falso. Essa semana mesmo ele desistiu de sua candidatura (pelo mesmo partido de Malluf e Pitta), dizem alguns, para não ter que falar mal de si mesmo em seu programa de TV. Mas deixem eu parar por aqui, logo os cientistas políticos chegam e fazer este tipo de confissão pode ser bem perigoso. Por favor, queimem este post logo depois de ler!


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