quarta-feira, 13 de março de 2013

As canções da minha mãe

Ao lado do sofá da sala havia um grande vaso e dentro dele um tipo estranho de “flor” de cana de açúcar, como uma grande crina tingida de várias cores. Do lado deste vaso havia um grande aparelho de som, que nesse dia era a estrela da casa.
O tapete estava dobrado ao meio e todas as cadeiras da mesa tinham os pés a apontar para o teto.
A estante, antes povoada por uma série de artigos de porcelana branca, dos quais estavam incluídos, pavões, viados, elefantes e outros tipos corriqueiros em estantes espalhadas por outras casas, agora estava vazia.
Se o meu desejo era continuar na sala para ver algum desenho animado que passaria na TV, estava no sofá, um pequeno canto reservado para mim, pois no resto dele, havia o outro sofá de 2 lugares, virado de ponta cabeça.
A cena pós-apocalíptica se repetia por todos os cômodos da casa, afinal, nada poderia estar no chão, pois passar cera vermelha no piso e encerar com a enceradeira eram árduas e longas tarefas. Era dia de faxina; e lá estava minha mãe, com sua roupinha especial e  pronta pra colocar tudo em ordem.
Todo esse caos era embalado, além do barulho da escandalosa enceradeira, por uma série de canções que habitaram o toca discos por muito tempo e hoje, a minha memória.
Havia o dia em que a faxina era embalada pelo ABBA, num clima quase de discoteca entre as mesas de centro, vasos e corredores a serem limpos.
Logo em seguida tocava as melhores de todos os tempos da Itália, na sessão nostalgia, com o Pepinno di Capri cantando alto:
E logo se ouvia de longe, Torneró, Sapore di sale, Roberta ainda do Pepinno, e muitas outras.
Sir Elton John, Chris di Bugh e Bee Gees também não perdiam uma oportunidade de cantar no dia do lerê lerê da minha mãe.
Há de se fazer uma menção honrosa ainda às fitas K7s do Roberto Carlos e tantos outros da jovem guarda, que tinham uma seleção especial no dia da arrumação, assim como uma fita com a gravação de uma prima tocando várias músicas clássicas no piano – Golfinho Azul era uma das preferidas.
Depois de algumas horas, onde os móveis e objetos da casa dançavam ritimados por essa trilha sonora, estava a casa novamente limpa e em ordem, com aquele brilho conseguido com rigor, pronta para ser chamada de Lar novamente.
Hoje posso dizer que minha vida aprendeu a ter trilhas sonoras e a possibilidade de viajar nelas através das doces lembranças como estas, por causa dela que embalou os momentos mais simples e especiais.

Um comentário:

  1. Faxina sem música e viagem sem livro é tipo, metade da diversão, dobro do castigo.

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