quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Um cigarro, um carinho

Saio de casa tão cedo que fica sob minha responsabilidade dar o tapa na nuca do Galo pro bicho desandar a berrar. Chego tarde e cansado, bem cansado. Opção minha, decidi zerar as dívidas, sempre elas. E tô indo aí, graças a Deus, né. Mas não tá sendo mamão não, fico pouco com a minha namorada, sinto muita falta dela e quando fico, durmo. É que nessa de pagar o seu Santander eu arrumei emprego em outro hospital na parte da manhã, e de lá vou direto pro outro emprego do outro hospital. Estipulei um prazo, 3 meses. Final de outubro tenho que ficar quites com o banco e esparramado outra vez na cama. Até ás onze se preciso for. E por mais que eu fique cansado tô gostando do novo trampo, conheço gente nova, doentes feito a gente velha do outro, mas que me faz bem conhecer. Aí quando eu me pego puto pelas mesmas mesquinharias de sempre, irritado com a covardia, companheira de longa data, a vida vem e me exige insistência. Exige personificada no seu Raimundo, véio gente boa cheio de célula ruim. Há pouco tempo atrás eu o levei durante duas semanas pra fazer as sessões de radioterapia numa clínica perto do hospital. E durante esses dias conversávamos sobre o Santos, Neymar, construção civil e câncer. E na hora que ele me perguntou se aquela radioterapia junto da quimioterapia que ele estava fazendo, mais a pancada de remédios que ele estava recebendo iriam adiantar alguma coisa, eu, pra variar sem ter certeza nem garantia de porra nenhuma, respondi que sim, que tinha de adiantar, porque afinal de contas era muita coisa contra uma só, o câncer, e ele deu risada respondendo que eu estava certo, que não tinha como o câncer vencer por que nessa ele estava sozinho, ao contrário do seu Raimundo, que tinha uma legião de gente e quimioterápicos a seu favor. Hoje seu Raimundo estava no hospital, com uma dor absurda, sem falar nem reconhecer muita coisa que foi dele, só geme. Lembrei do dia da pergunta, da minha resposta, lembrei dos momentos que eu reclamo, lembrei. Lembrei inclusive que eu não sei de porra nenhuma, e que não faço questão nenhuma de saber, e isso me conforta. É seu Raimundo, aparentemente eu estava errado, foi mal véio. Da próxima vez pergunta pra alguém mais corajoso, mais realista. Eu não sei de nada e gasto muito tempo preocupado com besteira, e nem sei o que é passar por isso. Então nem vem, perguntar pra mim eu cravo que sim, vai dar pé.



"Não se levanta ninguém a pondo pra baixo"
Edi, Centralrockbar.

9 comentários:

  1. Texto gostoso, como dormir e acordar do seu lado em cama de solteiro. A gente se bate, mas no final se embola. Te amo. Dormindo e acordado.

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Eu li nos ultimos duas o blog e não conheço nenhum de vocês, mas por esse texto e por essa frase: "Aí quando eu me pego puto pelas mesmas mesquinharias de sempre, irritado com a covardia, companheira de longa data, a vida vem e me exige insistência." Eu suspeito que você faz parte da minha equipe. "De enfermagem"
    E eu responderia o mesmo que você, porque mesmo sem saber nada, a gente não pode nunca roubar das pessoas a esperança e a força de lutar pela vida.
    Parabéns.
    Priscila.

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  4. Faz tempo que não lia um começo de texto assim, fora do lugar comum.

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  5. É Du, enquanto vc fica nessa vida louca de pagar contas a gente sofre sua ausência...

    E sinto lhe informar mas essa insistência em viver num mundo melhor nunca vai sair de vc pq vc é assim, dá esperança até p/ quem nunca ouviu falar dela!

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  6. Eu também nunca tenho coragem de falar a verdade para um paciente.
    O dia que eu tiver mudo de profissão. :-)

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  7. Linda crônica, Duduzão. E delícia o comentário da Tati lá em cima. Abs.

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