sábado, 30 de outubro de 2010

Quem tem um sonho não cansa

"É preciso sonhar, mas com a condição de crer em nosso sonho, de observar com atenção a vida real, de confrontar a observação com nosso sonho e de realizar escrupulosamente nossas fantasias; sonhos, acredite neles"
Vladimir Ilitch Ulianov Lênin


Estudante na Escola de Cinema de Munique em 1997, Florian Henckel von Donnersmarck estava em busca de ideias de roteiro para as aulas. Agitado com a falta de inspiração, certa noite ele se deitou no chão de seu quarto ouvindo Beethoven.

Enquanto a mente divagava, lembrou-se de algo a respeito de Lênin. Dizem que o líder comunista evitava ouvir a Appassionata de Beethoven, pois essa peça o emocionava tanto que tinha medo de tornar-se manso demais para implementar seus projetos revolucionários. “Se eu a continuar ouvindo não levarei a cabo a revolução”, teria dito.

De súbito, von Donnersmarck concebeu a trajetória de um homem cuja humanidade seria resgatada por meio da música. Assim nasceu Das Leben der Anderen (A Vida dos Outros), filme que 10 anos depois receberia o Oscar de “melhor filme estrangeiro”.

Revi essa preciosidade nesta semana e pesquisei um pouco sobre a peça de Beethoven. Dividida em três movimentos, dura aproximadamente 23 minutos. O compositor escolheu o tom de fá menor provavelmente porque a tecla mais grave nos pianos da época era um fá. A nota aparece em profusão ao longo da peça, lhe conferindo um matiz sombrio, por vezes interrompido por laivos de arrebatamento que parecem não se consumar.

Às vésperas do segundo turno das eleições presidenciais, escolhi a peça de Beethoven como trilha sonora. Conhecer o nome do novo presidente exatamente na considerada “noite sagrada” (hallow evening, em inglês) não deve ser mero capricho etimológico dos deuses. Vou resistir à quase inevitável blague que consideraria mais adequado chamar o “Halloween” de “Dia das Bruxas”, a fim de homenagear a provável ocupante da cadeira presidencial. A imbecilidade chegou a níveis tão absurdos durante a campanha que vamos levar um tempo para voltar ao tradicional bom humor verde-amarelo.

Na peça de Beethoven não há pausa entre o segundo e terceiro movimento, exatamente como vai ocorrer no Brasil. A sensação de continuidade será a mesma, a despeito de quem for eleito. O papel de Regina Duarte em 2010 foi desempenhado (canhestramente e sem trocadilho) por Paschoal Piragine e a desilusão parece ter vencido o medo.

Ouvir repetidas vezes a Appassionata aguçou minha mansuetude, proporcionando quase uma verdadeira brochura cívica. Felizmente, descobri uma versão com um delicioso tempero jazzístico. Não é hora de perder a ginga, ainda que ela venha em passos ½ desengonçados como a da violinista Naoko Terai.

Sonhos podem se transformar em pesadelo coletivo, como no caso de Lênin. No entanto, não me faculto ao direito de não participar desse momento ou de deixá-lo passar literalmente em branco. A porção poliana que vive em mim continua se equilibrando como a esperança da canção do João Bosco. Além da música, tomo emprestado do cineasta alemão uma frase que ele encontrou num pacotinho de açúcar e que o acompanhou durante todo o período de concreção de seu sonho: “O caminho do menor esforço só é asfaltado no começo”. Quem vem comigo? o/

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

sem título, sem vídeo, sem foto

O cai-cai nas pedras, equilibrando-se, até chegar na ponta, sem medo. Esforço recompensado,os 45 minutos, de contemplação.

Os três peludos, boa companhia, nas cores: preto e branco, amarelo e branco, e cinza. Tão tranquilos, calmos, nenhum latido. Fofos.

O desejo do mergulho, a ponto de lavar a alma.
Mergulhei, sem medo, no ininteligível dos seres, o inumano.
A torcida escondida não organizada, assovios. Outra vez, mergulhei, mais uma vez, e voltei. Livre.

Materializado o encontro: água viva dentro e fora, alma tocada. Viva a coragem, vontades.O bem-querer-se, querer-se muito, além, querer-se-bem.

Para C.L,a sincera gratidão, ao ensinar "matéria de salvação"...

O lugar bonito e a sensação gostosa,o prazer contínuo em andar, andar e andar.

Almejada há cerca de 3 anos.E saber que acertei na escolha: pedras, folhas caídas, embelezando as ruas. Indicando, por ali, a primavera. Cores em portas e janelas, predominante: o azul, o amarelo e o vermelho. Branco para o resto.

A simplicidade em cada espaço; igrejas antigas, algumas em reforma, lojas com artigos coloridos, passeio de charretes (a tempos não via, algo assim), a singularidade de cada espaço, resistindo ao tempo.

O som, as cores, luminárias várias, a beleza à noite. Gente indo, vindo, despreocupadamente.Sossego.

A imagem congelada: a hippie de cabelos longos, olhos distantes, boca fina, saia bordada e colorida, blusa de babadinhos com florzinhas amarelas. Tocando saxofone, à esquerda um cão branco com manchas pretas; à direita um velho de veste parecida (colorida e despojada), acompanhando-a, violão.

Prazeroso de ver e ouvir.Ambos sentados na calçada, de fundo a Tabacaria de janelas vermelhas, com lustres bonitos.Sem esquecer do retrato, o desenho do momento no momento - incrível.

A música "calhente", sensual, olhares devoradores, mais um pouco, esse pedaço é arrancado.(ufa!)

Próximo ao Quilombo, aventura por ruas bem estreitas.
O motorista piloto-de-fuga, a serra como montanha russa o friozinho na barriga. (up!) Da janela, mata fechada, o cheiro de chuva, terra molhada, céu nublado.Sem sol, apenas o mormaço.

Subindo, subindo, subindo...

A imensidão, o aberto das costas. Bravo, gigante em cada qued'água. Olhos maravilhados, no infinito, o falso verde e azul no vai e vem.Desaguando quaisquer resquício de doença,tristeza depressão/melancolia. Nenhuma gota, tudo deixado para trás.

Ah, essa existência de Deus...danada de bonita!

A comida agridoce, bastante suco, dos mais variados sabores/gostos. Peixe amargo, considerado o melhor. Salada colorida, paladar agradecido, a vontade de ficar ali.Cadeiras e mesas pra fora, o samba-rock e mpb ao vivo, noite bonita; gente de bom gosto e bom humor,sempre disposta ao diálogo,assuntos diversos. O sotaque, de todo tipo.

O relógio ignorado, a zero hora de qualquer momento. Registro, arquivo, melhor a mente...

Aquela adega estilosa, cheia de gabriela-cravo-e-canela, acalorando corpos. A mulher-aço-nua, logo na entrada.A arte, cacos de vidros colados, garrafas coloridas, doces, o afrodisíacos. Cheiros, vontades, e mais alguma coisa. O mel e maracujá sem cravo, rodadas, vira-vira, confusão, talvez fosse suco (?) de tão doce.O rosto corado, suor no pescoço/corpo todo, literalmente assim, e assim...

A linha azul perdida, Jabaquara. O desembocar de carangueijos e águas vivas, areia grossa cheia de conchas.Forte e canhões, àrvores velhas e pedras. Do alto,visão incrível da cidade. Vento, olhos fechados. Sorriso.

A linda exposição. O cheiro de barro, mesa lotada de pincéis, guaches, tintas ocres, cores, argilas, potes decorados e coloridos. Quadros vários, janelas abertas, toras de árvore pelo meio. Esculturas miletricamente trabalhado a mão. Um depoimento, uma música bonita, o teto com buraco transparente. As cortinas de bolinhas, com cheiro de chuva.

A conversa, a indignação, trejeitos daqueles estranhos (secos), a conclusão: não hastear bandeiras, se os braços não são fortes o suficiente para segurá-las.Ponto final. O casal super mega divertido fazendo mimicas para se fazer entender. A falta do inglês, ainda mais o espanhol, a urgência para o futuro. A gaúcha linda, a carioca engraçada.Em quase todo lugar, ficar louco, nem precisa o trabalho, é de tabela mesmo.Risadas.

Agora percebo, escrito menos da metade do todo.

Se soubesse que era bom assim, teria ido antes.
Prometo dar mais vazão/ATENÇÃO a rica e amiga intuição.

Ando assim óóó, carregando o sol.

O sol que não esteve por lá, a não ser aqui dentro, bem aqui, aqui mesmo, dentro de mim.

Será a tal felicidade? Se não for, é parente bem próximo.

O presente, bem presente.

Ou a entrada festiva e bonita dos 30 anos...

Seja muito bem vinda, NOVA FASE.

Oh delícia de VIDA!

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

O desenho da maçã não é uma maçã













Aquela distinção entre filmes para esquecer-se da vida e filmes para refletir, em minha opinião, é muito antipática.

Os primeiros são os chamados de filmes bobos, hollywoodianos, previsíveis, cheios de atores bonitões, um clímax angustiante e, de preferência, um final feliz. Os últimos são os Cult, com mais profundidade do que orçamento, preocupação com a arte fílmica, com cores, fotografia, finais nem sempre felizes ou até final nenhum.

Eu, que fui extremamente afetada pelo filme Irreversível, do francês Gaspar Noé, mas que também sou fã de filmes adolescentes no maior estilo Hannah Montana (é sério!), fico sempre achando que, no meio desses rótulos todos, o que mais importa para mim, como espectadora, é a história.

Tenho uma visão bem infantil nesse aspecto, acredito. Digo bem infantil porque essa visão começou quando eu tinha uns cinco anos e não mudou muito de lá para cá. Você pode considerar meio psicótico, mas, para mim, os personagens existem mesmo. Não é faz-de-conta: eles existem!

A vida deles não é como a nossa vida, que começa na maternidade e termina no cemitério, digamos. A vida deles começa e se encerra na história. Se a história tem uma continuação em que mudou o ator principal, se a história tem elementos completamente inverossímeis, se o roteiro tem buracos, se o produtor alterou a versão do roteirista e o filme terminou do jeito X em vez do jeito Y: não importa, a vida dos personagens é assim.

Para usar um exemplo bem extremo: em Sex and the City 2, tem aquela cena (spoiler, cuidado!) em que as muçulmanas tiram as burcas e mostram suas roupas de marca que estão por baixo. Pode parecer ridícula para muita gente. Eu mesma achei desnecessário. Mas, naquele mundo mesmo, esse detalhe não interfere em nada. Porque o mundo em que a Carrie, a Miranda, a Charlotte e a Samantha vivem é assim: mil coincidências acontecem, elas vivem aventuras incríveis, elas saltam com facilidade de um táxi para um camelo e tudo bem! Como um desenho de uma maçã não é uma maçã, uma história de cinema não é nossa vida. É a vida dos personagens.


Claro que vendo a vida dos personagens, podemos refletir, podemos rir, podemos inclusive fazer análises sócio-político-econômicas, mas é aí que volto para o primeiro parágrafo. Acho antipática essa divisão entre filmes para refletir e filmes para esquecer a vida simplesmente porque eu posso muito bem refletir por dias depois de ver um filme como O Amor é Cego, assim como posso voltar a pensar nos meus problemas bancários depois de ter visto um filme todo cult que, simplesmente, não me afetou.


Já aconteceu de eu não refletir nada numa aula de sociologia, psicologia da comunicação, e refletir muito depois de ver uma moça andando descalça pelas ruas de Mariana (cidade mineira em que atualmente moro). Simplesmente não é o filme que vai me mandar refletir ou não sobre algo: depende do meu estado de espírito, depende se aquela questão abordada me toca, depende como estou no dia. E tem gente que costuma refletir sobre tudo, e tem aqueles que não refletem sobre nada, que dormem em filmes cult pretensamente cheios de sentido.

A propósito: adorei Sex and The City 2 e sou uma grande fã da série. E como é chato ouvir de várias pessoas que as moças são fúteis, que são reflexo dessa nossa sociedade-ocidental-individualista-consumista e que, portanto, o filme é um lixo. Espera, espera! Concordo que elas são fúteis, consumistas e tal (elas não são só isso, tá! Mas ok, concordo e vou calar meu lado fã). Mas desde quando filme tem que retratar as pessoas como elas devem ser?


Os personagens são o que são: não têm a tarefa de ser modelos de comportamento. Se eu rio com a futilidade das moças de Sex and The City, não significa que eu faça apologia dessa futilidade. E muito menos que eu ache que o mundo real deva ser assim. Mais uma vez, esse é o mundo delas.


Se vamos fazer análises sobre o nosso mundo a partir do filme, ótimo; se vamos usar as atitudes das moças para exemplificar nossas idéias, legal, mas não precisamos exigir que o mundo delas seja de outro jeito. Deixemos o mundo dos personagens em paz! Aliás, é muito divertido ler e ver coisas com personagens “erradinhos”.


Tábata Romero Garcia

twitter: @tabataaa

email: tabataaa@gmail.com

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Balançando no bar


Veja só o bar que encontrei em Play del Carmem.

O negócio aqui é beber e balançar. Será que dá certo?

O que vc acha?

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Intimidade

Era uma vez um lindo casal de namorados. Vizinhos por coincidência, eles aproveitavam ao máximo a proximidade e se amavam sem parar. Com dois meses de história, seus amigos já começaram a reclamar a ausência dos dois em bebedeiras de sextas-feiras, jogatinas de sábado e comilanças de domingo. Mas não recebiam ouvidos e o casal se mantinha cada dia mais grudado. Viam os mesmos filmes, frequentavam os mesmo lugares, liam as mesmas revistas, não por nada, mas porque eles estavam sempre juntos, tornando todo esse resto inevitável. Os números de celulares já se confundiam,  os horários de ambos sempre coincidiam, e sempre que podiam faziam questão de dormir, acordar, tomar banho, escovar os dentes, comer, tudo na mesma hora e juntos.
Como de praxe, veio a segunda-feira de filmes e chocolates. Luz do quarto do rapaz apagada. Casal abraçadinho no colchão posto no chão, na quina entre parede e guarda-roupa, concentrados hora no enredo do filme, hora nos cabelos um do outro. Tudo se passava bem embora, dessa vez, os dois compartilhassem de uma gripe forte. Dores de cabeça, moleza no corpo, manha e outras mazelas.
Eis que ao fim de todos os filmes e chocolates, em meio a beijinhos, coseguinhas e gargalhadas, veio um inesperado momento de explosão. Que explosão seria essa, meu Deus?! Como isso pudera ocorrer?  
É bem verdade, leitores, que momentos de explosão ocorriam a todo momento. Explosões de todos os tamanhos, cores e formas. Ai, o amor... Simplesmente não cessavam, invadindo a alma, se enraizando no corpo. Deixando em torpor tais mentes apaixonadas. Mas essa explosão foi um pouco diferente, consequente de crises de riso, má alimentação e agonias intestinais. A explosão invadiu o quarto do rapaz gerando um constrangimento sem tamanho.
Como seria agora no próximo encontro? Como se olhariam nos olhos e jurariam amor eterno depois disso???
Na despedida, os 3 minutos de elevador foi preenchido com pesado silêncio e, durante a carona, o casal mantinha olhares furtivos. No beijo final faltou o “te vejo amanhã.” Os dois foram cada um para sua respectiva casa, maculados de incertezas sobre o futuro.


texto de Nathalia Queiroz e Alexandre Dantas

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Amor entre homens

O amigo estava em Buenos Aires. O amigo, não um amigo. É que, beirando os 30 e solteirão, ele via seu receio de "ficar para tio" crescer à medida em que crescia sua testa. Uma testa imperialista, que ia impiedosamente anexando territórios abandonados por fios de cabelo desertores, sob os anúncios apocalípticos de uma peste de nome Calvície. Como o amigo compartilhava da mesma situação e receio, pouco a pouco iam se tornando uma espécie de irmãos. Gradualmente, instalava-se uma relação que transcendia o rotulável.

Pois quando ele digitou em seu aparelho os 8 números do telefone do amigo, eram 5 horas e 16 minutos da madrugada de 1º de março. Foi atendido pela caixa postal. Sem motivo, decidiu apagar a mente e acender o coração, exatamente como se houvesse um interruptor para tal. E disse, sem pensar, para aquele receptor de mensagens robótico:

- Po, queria tanto falar contigo neste exato momento, e o máximo que consigo é falar com esta máquina... mas, pensando bem, tudo bem. Tendo estes segundos para ouvir minha própria voz, acho que acabo de descobrir: na verdade, só ia te dizer coisas banais, mesmo. Nada justificadamente importante a uma hora dessas. Aliás, que bom essa vontade de te dizer coisas cada vez mais banais. Quanto maior a banalidade, maior nossa proximidade.

E desligou o telefone. E percebeu que o amor pode ter mais versões do que aquela que aprendera com a novela, nos idos de seus 9 anos de idade.

domingo, 24 de outubro de 2010

CRIMES PERFEITOS NÃO DEIXAM SUSPEITOS

Já eram quase duas da tarde quando terminei minha entrevista de emprego.
Apesar do nervosismo natural que uma oportunidade dessa
causa, tinha confiança que havia me saído bem. O sol estava a pino e
meu estômago ansiava por comida. Na correria para não me atrasar fiz
um rápido desjejum com um copo de leite gelado.
No centro há uma variedade de restaurantes, em poucos metros encontramos
desde a requintada comida francesa até a saudável
cozinha oriental. Sem contar nas diversas lanchonetes
com seus “fast food’s” cada vez mais criativos.

No corre-corre, a multidão se aglomerava em busca de comida.
Mesmo nos tempos modernos, nos quais não precisamos caçar para comer
(pelo menos nas áreas urbanas), acredito que o homem ainda mantém sua
agressividade, ainda somos os mesmos predadores à procura do mais saboroso
alimento, dependendo é claro, do bolso de cada um.

O meu estava bem precário, devo admitir. Há algum tempo desempregado,
economizava o máximo que podia uma pequena reserva que mal pagava as contas básicas.
Pouco a pouco minha esperança por uma boa refeição diminuía.
O jeito era apelar para os
vendedores ambulantes, onde também havia muitas opções de “fast”
(ou “trash food” se atentarmos para tamanha falta de preocupação com
higiene de alguns vendedores).
Não sou um daqueles maníacos por limpeza, longe disso!
Mas com comida sou bastante exigente.

Após caminhar pouco mais de duas quadras, gastando alguns minutos
e a sola do meu sapato, enfim achei um lugar para comer.
Havia satisfação nas pessoas que comiam ali.
Que pelos dizeres da placa encostada no carro personalizado
de “Hotdog-móvel” degustavam um delicioso cachorro quente, que
podia ser com milho, bacon, ervilhas, prensado ou especial com direito
ainda a um copo de um refrescante suco de laranja ou limão.
Era o que meu estomago precisava, tudo que minha consciência
permitia e também tudo que meu dinheiro podia pagar.

O vendedor usava avental, touca no cabelo e pasmem até LUVAS!
Um verdadeiro “oásis no deserto” metropolitano!
Ele era um sujeito muito simpático, desses que atraem a
clientela com bom humor, brincava com seus clientes
enquanto preparava os lanches. Eu, tentando distrair a fome,
abri meu jornal à procura de alguma oportunidade de emprego que
pudesse ter deixado passar despercebida nos classificados.

Distraído na busca, só dei conta que minha vez havia chegado quando
fui interrompido pelo vendedor, perguntando como eu queria
o meu cachorro quente. Brinquei com ele dizendo que na minha
infância cachorro quente era: pão, salsicha, maionese, “catchup” e mostarda.
Mas com a fome que estava podia ser o especial.

- Cheio de sangue!

- O que disse? – perguntei a ele.

- A foto... A foto da capa! Está cheia de sangue...

- Ah sim! A manchete...

Ele se referia à foto de um homem que fora encontrado
morto na madrugada. E que em sua opinião seria provavelmente
“mais um crime sem solução”.
Discordei dizendo não acreditar em crimes perfeitos.
Ele riu mostrando que sua higiene com a comida não se estendia aos dentes.

-Há muitos crimes perfeitos, meu rapaz.
Tem gente muito criativa, com planos mirabolantes, esses jamais serão pegos –filosofou enquanto cortava meu pão.

Voltei à minha busca nos anúncios, mas ele novamente me interrompeu.

- Eu sei de um caso assim. Um crime em que o culpado jamais
foi descoberto, aliás, não houve ao menos crime perante as autoridades –disse ele enquanto passava a maionese.

Notando que não haveria sequer possibilidade de continuar minha leitura,
já que restara apenas eu para o vendedor tagarela papear,
dei o empurrãozinho que faltava para o homem me contar o causo.

- É mesmo?

- Sim! Sim! – disse ele empolgado, enquanto recheava meu “hot dog”
com milho e ervilhas. Sabe aqueles casais de quem todo mundo sente inveja?
Pois bem, conheci um casal assim. Ele amava aquela mulher mais que a si mesmo.
Fazia o que podia e não podia por ela.
Quando estavam juntos parecia
não haver nada ao redor dos dois. Todos dizem que ela era uma
mulher de sorte por ter encontrado um homem tão amável.

Mas talvez ela não pensasse assim, ou pelo menos naquela
altura do relacionamento o amor já não era tão intenso.
Digo isso por parte dela, pois nele dava para notar facilmente a
embriaguez da paixão. Todo o dia antes de voltar para casa,
ele comprava as mais belas flores e a presenteava com um lindo buquê.

Ela o recebia sempre com uma de suas camisolas de seda,
a qual caía muito bem em seu corpo levemente torneado.
E assim o romance foi levado até uma típica tarde de verão.
Sua mercadoria naquele dia foi toda vendida, ele estava contente,
com o bolso cheio de dinheiro e resolveu lhe fazer uma surpresa.
Mal sabia que naquele trágico dia a surpresa estava reservada para ele.

Antes de retornar para casa passou numa joalheria, onde sua amada
namorava há meses um lindo anel de prata recheado com
pequenas pedras ametistas. Ele, em segredo, guardou todos os dias
uma parte dos seus ganhos, conquistados com muito trabalho.
Fez isso durante semanas, e finalmente podia presenteá-la.
Pagou a jóia à vista. E pediu para a vendedora
o porta-anel mais bonito que houvesse na loja.

Era um lindo presente, não mais belo que os olhos de sua amada.
Não via a hora de lhe colocar a jóia no dedo, e ver seus olhos
reluzirem o brilho prateado do anel.
Ao chegar em casa, abriu a porta com cuidado
para surpreende-la, estava tudo silencioso. Tirou os sapatos e foi até a suíte.
No corredor pode ouvir o chuveiro, ela estava no
banho preparando-se para ele, pensou.
Abriu a porta do quarto devagar e se deparou com a cama desarrumada,
lá pôde ouvir melhor o som da água caindo no piso,
misturado com pequenas risadas e gemidos. No chão, espalhadas
pelo carpete azul, as roupas que para sua surpresa e desgraça
não eram apenas de sua mulher.

Suas mãos trêmulas eram quase impossíveis de coordenar,
mas o seu ódio o conduzia. A porta do banheiro estava apenas
encostada e ele com um toque sutil abriu apenas o suficiente para ver com seus
próprios olhos, através do box de vidro transparente, sua mulher, de joelhos.
A razão da sua vida, usando todo prazer que sua carícia oral oferecia
em outro homem.

A vontade do homem traído era arrebentar os dois naquele momento.
Mas não o fez.

- Não o fez? – perguntei nessa altura já com a boca cheia de pão e salsicha.

- Não! Ele se conteve, jogou o anel no chão, saiu do quarto
com a mesma discrição que entrou e foi até o quartinho de ferramentas.
Ao abrir, imaginou o estrago que cada uma daquelas ferramentas
poderia produzir nos amantes. E preferiu o machado.
Sua escolha não poderia ter sido melhor, pois afiado como estava,
depois de cortar lenhas durante todo o inverno, seria como cortar manteiga
com faca quente.
Os gemidos e gritos de prazer invadiam todo o corredor, eles se amavam mais
e mais sem ao menos imaginar o terrível destino que os esperava.

Ele voltou ao quarto com o machado em punho, nessa hora sem a preocupação
de ser notado. Abriu a porta do banheiro, e se aproximou do box.
Sua companheira e o amante nessa altura nem
poderia nota-lo devido à posição em que se encontravam.

Com toda sua força, o homem traído desferiu um golpe contra o box,
o som do vidro estilhaçado pelo machado envolto
ao grito de dor do amante,
que sofrera com toda a carga da lamina do machado em suas costas,
transformou o ambiente.

Ele sentiu prazer ao ver sua mulher desesperada partir em cima dele,
e com um soco violento em seu rosto atirou-a no chão.
O amante, caído, tentava se arrastar, cortando sua pele nos estilhaços.
Em vão. O algoz se aproximou e prensando as costas da vitima contra o piso,
retirou o machado com fúria maior que a usada
para cravar-lhe anteriormente. Então com o poder de um carrasco encostou
a lamina manchada pelo sangue no pescoço do desventurado.
Ele queria que o sujeito sentisse todo o pavor, queria que o sussurro da morte
iminente lhe soprasse os ouvidos naquele instante para então desferir o golpe fatal.
A cabeça, arrancada do corpo parecia banhar-se no sangue.

Então voltou sua atenção para ela, o amor da sua vida, que tentava se levantar.
Estava branca como leite, com o lado esquerdo da face inchado pelo
golpe que sofrera. E mesmo assim ainda era atraente, sua beleza hipnotizava
o pobre homem, e ela sabia disso. Suplicando para que ele poupasse sua vida,
ficou de joelhos.
Ele não conseguia odiá-la, por mais que quisesse, e como queria...
Mas não conseguia. Aproximou-se chorando e deu lhe um beijo suave na testa.
Mas fora traído novamente. E sentiu a sua fronte ser cortada por um
pedaço pontiagudo de vidro que ela sorrateiramente apanhou do chão.

Ele caiu e ela na tentativa da fuga escorregou no piso molhado de água e sangue.
Então ele a pegou novamente, mas dessa vez sem piedade alguma
socou sua cabeça no chão, uma, duas, dez vezes, quanto mais batia,
mais queria bater, e assim o fez. Até que o barulho das batidas foi
ficando cada vezmais abafado pela massa encefálica que recheava o piso,
os longos fios louros da amada e seus dedos.
Então ele sentou-se embaixo do chuveiro e ali permaneceu por horas.

Quando voltou a si, sentiu-se bem por tudo aquilo, tinha lavado sua honra e
precisava limpar tudo aquilo. Pensou por um tempo numa maneira de
ocultar todo aquele lixo, aqueles dois imensos pedaços de escória
que sujavam seu banheiro.

E arrumou uma maneira, digamos... Criativa! Um plano perfeito para que
nunca fosse descoberto. E assim o fez. Até hoje ela e o amante, um vendedor
de livros, são dados como desaparecidos. E o homem pode assim ter
novamente sua vida, com dignidade e honra. Um crime perfeito viu só?

- É isso? E a polícia? Nada descobriu? – perguntei

- Nada! Bom, meu rapaz, vejo que terminou seu lanche, e já está
na minha hora – respondeu-me o vendedor tirando suas luvas e o avental.

- Mas o que ele fez com os corpos?

- Desfez-se deles. Ora, use sua imaginação...

- Não, espera! Se fosse um crime perfeito você não saberia.
Ao menos que...

Foi então que notei, ao vê-lo sem touca,
uma enorme cicatriz em sua face.
Isso me gelou a espinha, e me paralisou de tal forma que
não consegui dizer mais nada. O homem terminou de guardar
suas coisas, entrou no carro e partiu.

Pasmo com tudo aquilo, senti um pequeno incomodo, como se houvesse
chupado uma manga e um fiapo tivesse preso entre os dentes, cutuquei
com o dedo e retirei um pequeno fio de cabelo louro. E aquilo me trouxe
a última coisa que o vendedor me disse quando o questionei sobre os corpos...

“Use sua imaginação...”


Conto de Fernando Ferric - Col. Impossível

sábado, 23 de outubro de 2010

Every little thing she does is magic

Eu não sei cozinhar,
Eu não sei dizer o que sinto,
Eu durmo mais do que o necessário,
Eu faço tempestade em copo d´agua,
Eu morro de medo de barata,
Eu lavo roupa suja sem olhar o bolso,
Eu choro demais,
Mas não estou mais sozinha.
Tenho alguém pra quem voltar no fim do dia.
E que por mais que eu faça tudo errado sempre
Ele acha que tudo que eu faço é mágica.



sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Turno da Noite

De Luiz Adriano Lima 


Receber o convite para participar do Blog das 30 Pessoas foi extremamente gratificante. Logo, fiquei extremamente extasiado – e ainda estou –, mas logo me veio a dúvida: sobre o que eu escreveria? E, evidentemente, a resposta mais lógica era aquela em que eu componho um texto no qual eu me apresento, comentando basicamente sobre as coisas das quais eu gosto, quais me satisfazem, que programas me entretêm. Penso, porém, que começar desse modo seria muito limitador e me descrever de modo objetivo seria colocar a mim mesmo como uma figura plana e simples – o que definitivamente nenhuma pessoa é.


Opto por começar de outro modo. Posso, ao longo do tempo que escrever aqui, apresentar várias vertentes minhas e, assim, vocês leitores vão juntando as várias informações e montando a minha personalidade. Tendo
optado por isso, veio-me outra dúvida e essa foi bem mais cortante. Escrever sobre o que eu gosto ou sobre o que não me agrada? Escrever sobre o mais óbvio ou sobre o mais oculto de mim? A solução veio quando eu e o Pedro, um colega de quem gosto muito, conversávamos de madrugada sobre diversos assuntos e eu concluí que aquele momento – aquela conversa à meia-luz – me punha num estado inerte de êxtase.


Há algo nas conversas noturnas que as diferem das conversas que temos ao longo do dia. Nas conversas que ocorrem depois da meia-noite, os interlocutores parecem mais suscetíveis a falar aquilo que realmente desejam, sem amarras sociais ou preocupações com semântica, as quais usualmente estão presentes. Até porque, às três horas da manhã, se conversa apenas com quem realmente se quer conversar – e isso torna qualquer diálogo bem mais intimista e prazeroso. Os tópicos também são mais interessantes: eles parecem consideravelmente mais próximos dos falantes. De madrugada, os assuntos que surgem afloram, vêm de dentro, expõem-se de maneira mais pungente – seja o gosto por arte, por sexo, pela natureza, pela própria vida; tudo isso flui mais facilmente. Talvez esse fluido constante se deva ao sono que se aproxima e à conseqüente necessidade de afugentá-lo. Ou talvez simplesmente aconteça pela diversão que há em conversar no horário em que as outras pessoas dormem (e, portanto, ausentam os seu julgamentos).

Não me restam dúvidas de que são essas conversas que me motivam a entrar no MSN e ficar até tarde acordado. Há outros motivos, evidentemente; mas decerto poder conversar abertamente é o que me instiga – e aposto que instiga a muitas outras pessoas. Não posso terminar esse texto sem agradecer a duas pessoas muitos especiais, que tornam as minhas noites mais interessantes: Pedro e Marcelo. Ambos me aprazem quando dedicam suas madrugadas a conversar comigo e, com cada um, tenho longas conversações, quase intermináveis, sobre diversos assuntos. Não anseio pelo término disso, quero, aliás, que dure muito mais e que conversemos ainda por um longo tempo – seja pessoalmente ou virtualmente. Há definitivamente aqueles que apreciam o dia – eu o aprecio –, mas penso que é o turno da noite que me mais me faz querer viver.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

20 de Outubro

Olá pessoal.

Finalmente chegou meu dia aqui no blog - e também o meu aniversário... 31 aninhos.

Eu pretendia escrever algo bacana aqui, mas já estou um pouco alto... assim, nem vou arriscar.

Mas, aproveito para convidar os companheiros de blog e os leitores à deriva que estiverem em São Paulo na ocasião para comparecer na comemoração, que acontece na sexta, 22 de outubro, na Vila Madalena, em São Paulo.

O bar é o Capital da Villa e a banda é o Comitê do Soul, com muito... soul! Mais informações no site http://www.capitaldavilla.com.br/ ou na arte abaixo, que acabei de produzir:

Arrivederci!


É 15 conto ome e 10 conto muié!

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Best of you

Eu assistia esse video quando lançou e me dava uma vontade grande de correr, gritar, insistir e mudar o mundo. Eu acho bem louca a edição, as imagens, assisti o making off na época e mostrou o trampo que os caras tiveram, duzentos nêgos todos de preto, cheios de luzinhas no corpo pra fazer uma cena de 2 segundos. O diretor tinha acabado de perder a mulher por doença, e foi lá e fez um clipe bonito desses. É, o mais legal foi assisti-lo agora e saber que a vontade ainda está aqui, esperando ser provocada, feito agora.

*O vagabundo que postou ele no youtube não deixou liberado pra incorporar em outro site.

domingo, 17 de outubro de 2010

Contemplar



Foi isso que fez um senhor que vi diante da Fonte Gaia, em Siena, cidade italiana na região da Toscana. Eu já tinha visto fotos da fonte em livros, sabia que a encontraria enquanto folheava o guia na viagem de trem, mas não imaginava que ali aprenderia um dos maiores ensinamentos dessa viagem.
Turista deslumbrada, ao encontrar algum dos belos locais que eu desejava conhecer, sacava de imediato minha máquina fotográfica e disparava quantos flahes a bateria e o cartão de memória me permitiam. Estava empenhada justamente nisso quando o velho homem chegou. Parou em frente à fonte, debruçou-se na grade, deu uma espiadela por cima dos ombros, dos dois lados, como que para saber se alguém poderia perturbá-lo naquele grande momento. E então, iniciando o que chamo de ritual de contemplação, não apenas olhou para a fonte, mas a admirou.
Nos seus olhos, que já viram bem mais que os meus, uma mistura de deslumbramento e fascínio. Observaram, creio que pela primeira vez, atentamente a fonte que até então eu só tinha visto pelo visor da câmera. Estavámos, de fato, diante de uma grande obra. Para que tirar fotos (as mesmas que a gente vê desgastadas em livros, sites e guias), se temos a chance de contemplar ao vivo, com esses olhos de ver, a maravilha desenhada e conservada bem diante do nosso nariz?
Não deixei de tirar fotos depois disso, obviamente. Mas antes de enquadrar o monumento, contemplo-o. Enxergo com olhos bem atentos, degusto os detalhes, mesmo quando o mapa me grita o tanto de coisas que ainda tenho de visitar. Destinar as lembranças de tudo que vejo não apenas à memória virtual, mas também a minha própria, sem dúvida, tornaram-se as viagens ainda mais interessantes.

sábado, 16 de outubro de 2010

Adaptação

Home care talvez seja uma das maiores sacanagens do médico empresarial. A transferência do custo e responsabilidade à família é algo brutal.
 
Apesar do convívio familiar contribuir para a melhora. Acredito mais na idéia do fim digno.
 
O que me impressiona é a capacidade de uma pessoa se adaptar: seja a sonda, a cama, a aspiração ou a alimentação líquida.
 
Será que faço bom uso da saúde perfeita que hoje tenho?
 
 
 

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Fixação

Desde que eu soube que a remota possibilidade de realizar um sonho de consumo não era tão remota assim, recomecei o velho ritual obcecado: reviro pistas, traço metas, arquiteto planos infalíveis, ensaio falas, fantasio panoramas utópicos e me flagro sorrindo como idiota sem ter motivos ou cantarolando Kid Abelha pelos cantos da casa.

Meu lado racional, mesmo sendo sufocado pela euforia, não deixa de me indagar quanto tempo levará até que eu me frustre e volte ao habitual estado de miséria.

Podem começar o bolão.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Pessoa

- Mãe, olha o que eu achei!
- Que isso?
- Uma pessoa, mãe! Parece que nunca viu!
- Eu sei o que é! Eu quero saber o que tá fazendo dentro de casa?
- Ela veio me seguindo, mãe! Posso ficar?
- Tá maluco? Pessoa dentro de casa só dá trabalho.
- Mas mãe, eu cuido direitinho! Será que é homem ou mulher?
- É mulher, não tá vendo... é, hmm... os... com os peitos desse tamanho aí e você não sabe? E ainda por cima é mulher fresca, a gente não tem como cuidar. Óculos escuros, chapinha. bolsa Louis Vuitton. Quem é que tem dinheiro pra manter tudo isso?
- Mas mãe, o José Vitor tem uma pessoa em casa e a mãe dele deixa.
- Aposto que ele achou um mendigo na rua. Esses são fáceis de cuidar, qualquer coisa que ganham, estão felizes. E essa aqui? Vai querer carro importado, blackberry, ipod, acessórios pra combinar com a blusinha. E se ela fica grávida? Já pensou?
- Mas mãe!
- Chega! Pessoa, não! Se quiser, te dou uma tartaruga.
- Tá bom... que saco, nunca posso ter nada que eu quero.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Investigação acerca (do crime) de Eduardo AT

Todas as janelas da casa dão para muros. Ele vive uma vida sem paisagem. 


Barrando a porta da sala de estar, uma mesa balcão com dois computadores. Empilhados: livros, revistas, dvds e cds, desordem de canetas, agendas. Fios entrecruzados à beira de um curto. Imaginam-se horas diante do escritório improvisado. Vida sem visitas. Caos no trabalho e nos dias. Utopia de alguém que insiste em ganhar a vida com escritos e filmes.

Estantes de metais encurvando livros. Burras de carga de um pretenso saber. Pouco mais que a metade com páginas anotadas a lápis, o que pressupõe que nem todas lidas.

Sobre a geladeira um boneco articulado em fuga. Adesivos em desordem. Lâmpada queimada na luminária dupla. Torneira estrangulada para não gotejar segredos martelando insônias na madrugada. Interruptores falhando em luz, impondo escuridão. [Na última gaveta da pia, interruptores e borrachinhas novas para o conserto que por preguiça, falta de tempo ou tédio não realiza.]

No guarda-roupa, calças tamanho 42 em harmonia com outras 48, assim como camisetas M com GG e XL (velhas e novas), o que pressupõe oscilação frequente de peso ou grave doença recente. O predomínio de camisetas pretas com gola V convivendo com outras, de cores diversas, nunca usadas. Luto ou equivocada forma de se fazer atraente. 

No cômoda, suplementos de academia em convivência com apostilas de cursinho. Anotações, rascunhos em papéis, planos de aula, lista de alunos, redações corrigidas, tudo denunciando a segunda profissão, que de mais antiga só perde para a das putas; mas sem igual prazer, igual reconhecimento e remuneração.

No criado mudo, a tristeza de contas por pagar e pequenos recibos com seu nome estampado em solidão, tudo reafirmando o fato de ser solteiro e estar por si.

Numa sacola, dúzias de preservativos tanto gritam dias de intensa promiscuidade ou de absoluta abstinência. Cuecas novíssimas, de marca cara dando indício de relacionamentos recentes, tudo a par de meias confortáveis da algodão, tênis diversos, bonitos, não-gastos, empilhados e que dizem, por isso, que ele precisa andar mais, viajar mais, buscar novos caminhos.

Na janela do banheiro, várias escovas de dente, pastas pela metade, pomadas para toda espécie de praga, alergias. Lâminas de barbear. Pinças. Cotonetes. O nonsense de pentes finos e xampu que  riem de sua cabeça raspada.

Na cozinha, o relógio que antecipa seus costumeiros atrasos, anuncia com seus ponteiros as 2:06 da noite, ao lado de um pinguim exilado que mira do alto a mesa onde pares de pratos comprovam um jantar noturno. O desleixo da mesa  e as panelas ainda quentes no fogão falam de uma noite compartilhada. Mas os cobertores e travesseiros em dois sofás distintos, voltados para tevê berram amizade (e não sexo) nesta noite fria de novembro.

Não há porta-retratos, imagens de santos na casa, poucos bibelôs (que desgosta), mas há um tarô no criado mudo cuspindo arcanos e destinos. Há também um baralho lacrado noutra gaveta, convivendo sem fé com uma bíblia, documentos postos em pastas e pequenos aparelhos eletrônicos, comprimidos para dores, gripe e azia. 

Agora pouco tocou o celular. São trinta e dois números listados na agenda. Seis ligam com frequência. Os torpedos mais recentes são de André, Cinha, Cristiane, Murilo, Matheus P e Lucas. Âncoras com mundo exterior que impedem que afunde em si? Trombetas que anunciam que a vida está lá fora, e se faz melhor nos encontros?

.
Por fim, esse espelho atrás da porta do quarto para ele se ver, para se saber, para se fotografar vezenquando. Espelho que é testemunha ocular do espetáculo monótono dos dias, e que não lhe questiona o certo/errado do viver. Assim, paremos neste espelho, que amplia a ilusão do quarto e de si, já que todos os mínimos indícios do dia  vão dar no sujeito frente à superfície: ele que é dele mesmo a (sua) mais frequente companhia. 


segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Pra não trocar as pernas

Tranças
Ana Guimarães e Lucas Veríssimo

Abre e cruza cruza e abre e
Abre e cruza cruza e abre e
Abre e cruza cruza e abre e
Abre e cruza cruza e abre e
Abre e cruza cruza e abre e
Abre e cruza cruza e abre e
Abre e cruza cruza e abre e
Abre e cruza cruza e abre e
Abre e cruza cruza e abre e
Abre e cruza cruza e abre e
Tesoura


sábado, 9 de outubro de 2010

Meu testamento


Quando eu morrer
(não faça essa cara, já está decidido, não importa o que eu faça ou deixe de fazer, minha morte é certa),
não chore.
Saiba que morrer me deixará feliz, pois finalmente conquistarei o meu maior sonho: o sossego.

Enquanto eu descanso, eis o que desejo que façam com o que deixarei para trás:

Queime
Tudo o que puder pegar fogo e desaparecer em cinzas.
Isso inclui meu corpo. Primeiro, recicle-o ao máximo. Olhos, sonhos, órgãos, cabelos, cicatrizes, unhas, ideias. Depois, queime o resto sem dó nem lágrima. Não se preocupe em transportar-me até um local específico. Espalhe-me em qualquer sopro de vento a céu aberto, porque de lá eu saberei aonde ir.
Faça dos meus cadernos, cartas, postais e fotos uma fogueira. Proíbo-te de ler o que está escrito neles. Eram meus, e depois de mim devem virar brisa.

Doe
Além dos meus órgãos, as roupas, livros, sapatos, móveis e projetos que nunca saíram do papel, para alguém que fará melhor uso deles do que eu.

Delete
O que eu não tiver deletado ainda. Se, como ocorreu com Santiago, minha morte for anunciada, pule essa etapa, pois eu já a terei cumprido. Não deixe, porém de me avisar, caso você saiba que vou morrer.
Esqueça-se da pena de apagar centenas de imagens do meu Facebook. O mundo tem fotos demais. Também tem tweets demais, por isso delete os meus também.
Meus blogs... Faça o mesmo com eles. Todos eles. Menos esse.

Lembre-se
De não se revoltar se eu morrer uma morte violenta, principalmente se ela tiver sido intencionalmente provocada por outra pessoa. De maneira alguma brade por vingança. Não cogite roubar um olho para substituir o meu ou defender leis mais duras como a pena de morte ou a redução da idade penal. Eu sou contra tudo isso e recuso que sujem meu nome covardemente, quando eu já não mais poderei protestar.
De plantar uma árvore em minha homenagem, em algum lugar onde ela possa crescer e produzir oxigênio por algumas centenas de anos. Eis aí algo mais compatível com o meu nome.
De que não sentirei a mínima falta das vidas que levei nesses pelo menos 28 anos e quatro meses. Sobrevivi aos maus momentos. E aos bons também. A todos eles, menos um, o que finalmente me matará.
De que vivi do jeito que queria viver. Reencarnei durante a mesma vida todas as vidas que consegui. Levei meus defeitos em todas elas, e felizmente deixei alguns pelo caminho. Sabendo que seria imposível me libertar de todos, abracei-os, adotei-os como parte de mim, pessoa imperfeita. Pessoa real.
De mim.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Meu filho é melhor que o seu (por Carol Campregher)



Nestes últimos meses meu filho começou a fazer testes para comerciais. Foi assim: um dia ele foi passear com um amigo (que quando era menor fez figuração para o danoninho) e no meio do passeio o menino tinha um teste. Meu filho acabou fazendo também, a agência gostou e desde então está agenciando ambos.
Ele até já foi sondado outras vezes, mas começavam querendo fazer um book super caro, e sempre acho que as agências faturam mais ali, no book. Cobram um absurdo, e os mostruários são quase todos de crianças horrendas, o que me faz mais ainda acreditar que é um belo golpe. Fora isso, quando pequenininho, meu filho não era muito extrovertido o suficiente para a "profissão", digamos assim.
Mês passado ele passou num teste para fazer um filminho de três minutos para o site da Fiat. Fiquei muito feliz. Ele é primeiro da classe, aprendeu a ler com três anos, não chora para tirar sangue ou tomar injeção, mas quem se importa?

Parece que pra ter brilho tem que ser jogador de futebol ou ator, tem um tchan a mais. Nas conversas sobre filhos parece sempre que a pessoa morre de orgulho da cria, por qualquer coisa, qualquer coisa mesmo. Poderia ficar falando horas das proezas do meu, mas é terrivelmente irritante ficar ouvindo mães se gabarem, principalmente quando o seu é bem melhor (brincadeira). Seu filho é sempre o mais esperto, o mais bonito. E os defeitos se tornam qualidades, mal criado é "tem personalidade" gordo é "fofinho", burro é "engraçadinho" bagunceiro é "divertido", e por aí vai.
A verdade é que as pessoas são em sua maioria feias e chatas. As muito perfeitas são irritantes. Seu filho é/será uma pessoa, logo você já sabe. Conforme-se. Além do mais, a chance de você ter parido um novo Pelé é uma em milhões. Na próxima tente a mega sena acumulada.

Mas voltando ao MEU filho, aqui vai o link do filminho. E em caso de dúvida, ele é a criança MAIS bonita que aparece.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Love Never Dies

Estive em Londres há uns dias e assisti à continuação do Fantasma da Ópera. Pra quem gosta, um prato cheio. Eu, que amo...bem, amei. Principalmente a música tema, com uma letra linda!
Comprei o cd, e fico ouvindo, ouvindo, ouvindo...essas músicas que não saem da cabeça nunca, sabem como? E como eu tenho a teoria de que a gente só consegue tirar uma música da cabeça se conseguir passar pra cabeça de outra pessoa.... Um clássico pra esgoelaaaaaaaar no chuveiro!
Com vocês...

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Almoçionante

            Primeiro eu queria me desculpar pelo trocadilho infame, mas é que não conseguir resistir. Faz quase um ano e meio que trabalho em uma repartição pública, neste tempo quase todo sempre fui almoçar sozinho, por opção e por amor a vida. Amor a vida alheia, pois meu humor não é nada que se possa considerar como algo saudável quando estou com fome,e, amor a minha própria vida, pois querer matar alguém, também não é saudável. Pois bem, diferente do que podia imaginar ultimamente, esta minha uma hora de almoço tem me reservado várias emoções e surpresas. Eu demoro cerca de vinte minutos pra almoçar (ta aí uma das causas para minha gastrite permanente) e nos outros quarenta minutos costumo andar pela avenida paulista, seja para dar uma passada em uma livraria, seja para ir a um fucking banco.
            Outro dia eu estava só fazendo o tempo passar mesmo (não abro mão dos meus sessenta minutos) e eis que quando fui passar por uma banca um policial abordou a mim e a outros três estudantes do colégio são luiz “não pode passar, fiquem aí, não pode” , a gente tentou retrucar “ma...mas...o que aconteceu?” , ele retrucou “um problema no banco, agora se afastem”. Bom a gente se afastou conforme o pedido dele, e não demorou mais que alguns segundos para aparecer dois guardas, armados, andando lentamente para trás, por um momento me senti num desses filmes sobre gangsters americanos. Estariam os ladrões lá dentro? Confesso que geralmente (quase sempre) torço pelos bandidos em assaltos a banco. A torcida parece ter dado certo, uns vinte minutos depois a policia liberou a passagem para os pedestres, os ladrões já tinham fugido, de metrô, agora somente um unitário poderia impedi-los.
            Em outro almoço eu estava atravessando a rua, praticamente no mesmo lugar, quando um motoboy caiu da sua moto. O meu sonolento instinto solidário me fez ir até lá ajudar o motoboy. Eu mais uma outra pessoa o ajudamos a levantar, tiramos a moto dele debaixo de um carro e a levamos para a calçada, olhei bem para a moto antes de estender o pezinho (da moto...) e foi aí que me arrependi: o motoboy era corintiano. Bom, depois dessa eu haverei de ir ao céu, porque, se ele realmente existir, tem um lugar especial para quem ajuda corintianos. Na volta desta ação benevolente um carro quebrado na Haddock Lobo, nada de muito estranho né? Um guincho, uma pessoa ao celular tentando resolver... Difícil foi explicar isso ao pai da mulher que teve o carro quebrado e, ainda por cima, contava com a desconfiança de seu genitor: “Pai! Não, não acabou a gasolina!”
            Eu geralmente uso estes quarenta minutos do almoço para fazer hora e a digestão, até porque quando saio com a intenção de fazer várias coisas, geralmente não faço nada. Não sei se sou eu quem produz (mesmo que inconsciente disso) o imponderável ou a região e sua movimentação toda que proporciona isto, mas vem sendo uma emoção almoçar ultimamente.
           Ah, hoje (terça, 05/09/10) fui almoçar e vi uma discussão na lotérica, houve um tiroteio em uma agência de turismo e um repórter quis me entrevistar, mas isto fica para um próximo post.

Vlado Galli

terça-feira, 5 de outubro de 2010

CURTA - CENA I - Tarde - Vão do MASP.

- Você se parece muito com uma amiga.
- Sério?
- Muito mesmo, principalmente assim de perfil.
- Engraçado, as pessoas dizem isso. Eu tenho um rosto comum.
- Não é comum.
- Que loucura. Estou esperando uma pessoa e ela não chega.
- É péssimo esperar, né?
- Você não gosta?
- Você gosta?
- Normal.
- Eu estava comprando uma casa no Butantã. É uma casa linda, mas no meio da negociação o proprietário alugou. Se ele tivesse vendido, tudo bem. Mas sabe quando você tem certeza de que aquilo será seu?
- Humrum.
- Você mora com seus pais.
- Moro sim.
- Legal né, morar com os pais?
- É muito legal. Você só tem essas duas tattoos?
- Tenho mais uma nas costas.
- Asas?
- Dragão.

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@cleytoncabral

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

As últimas palavras deste nosso amor

Por Gilberto Amendola

(...) pode ser amor de roupa no varal. Não, não, desculpe, um amor de vento batendo na roupa estendida no varal. Não, não, um amor de flor na janela. Não, não, digo,amor de vaso de flor no parapeito da janela. Melhor, amor de flor no parapeito da janela do oitavo andar. Ou ainda, amor de flor no parapeito da janela do oitavo andar, onde suicidas ganham asas. Ok, que seja, amor de arranha-céu, sem roupa no varal, flor na janela ou seres alados. Pode ser um amor árido. Amor de cactos quando se abraça. Amor de espinho quando passa. Ou prefere amor deserto do Saara? Amor grão de areia dentro da ampulheta. Amor de ponta-cabeça. Oásis de bolso também é amor. Cantil que transborda vodca. Quer um amor ressaca? Amor que descasca. Neve de células mortas sobre o ombro do capataz. Pode ser o amor uma boca cheia de dentes? Meus dentes cheios de fome, minha fome cheia de carne, minha carne cheia de alma, minha alma cheia de nada, meu nada cheio de números, meus números cheios de passado, meu passado cheio de sentido, meus sentidos cheios de razão, minha razão cheia de emoção, minha emoção cheia de lágrimas, minhas lágrimas cheias de riso, meu riso cheio de saudade, minha saudade cheia de você. E o que era você está cheio de trincos. Mas ainda é amor, viu? Amor que se excede. Amor de troncha, de revista velha, de páginas em branco e de rascunhos – o rascunho de um assalto a banco. Amor de ligar os pontos, colorir espaços, dobrar bordas,contornar curvas e beber água da chuva até se afogar. Amor que sabe mergulhar. Conchinhas do mar. Caranguejos. Pérolas. Amor de pedra falsa em pescoço de madame. Colarzinho sem valor. Espelhinho de índio é o meu amor. Amor barato. Promoção de sentimentos, liquidação dos desejos, suaves parcelas. Abaixo do custo é amor. Pague 1,leve2.Tem que ser amor desperdício,amor de torneira aberta na cozinha. Amor que pinga. Amor conta-gotas. Amor tic-tac de relógio atrasado. Pode amor assim? Amor que chega quando ela já foi embora, amor que é sombra (amor que é sobra), lampejo,restinho de perfume na sala. Amor que viaja. Tudo bem, amor que vai de trem, avião, balão de gás. Amor, amém. Esse amor, nosso amor,pode ser amor virtual, só durante o carnaval, cometa Halley no céu de setembro. Tem amor que é seco – e que também é nosso. Ou amor polvilho. Migalha também é amor. Olha quanta formiga marchando sobre os restos desse amor! Não, não, não pise neste amor inseto. Mesmo dedetizado ainda é amor. Ou não? Amor de casa limpa. Poeira embaixo da mesa. Moedas no vão do sofá também são valorosos sinais de amor. Esqueci no bolso da minha calça aquilo que chamava de amor. Joguei na máquina de lavar e esperei. Amor que roda deixa a gente tonto. Antes fosse carrossel, roda -gigante, pula-pula. Só pra rimar: amor é mula. E se você quiser, amor é tanajura.Não,não é da pura, não é da boa, não é daquela
que você mais gosta. É só amor que encaixa. Ah, e se faltar uma peça é o amor que nos resta. Talvez o único, o último, o derradeiro. Talvez, quem sabe, o mais bandoleiro. O tal amor bandido – fugindo de pangaré. Amor que vai a pé, gasta sola de sapato, amor língua de fora. Amor exausto. Cansou de tanto amor? Amor até a tampa. Chega, meu bem, assim balança. A morde vida inteira, dia à toa, brincadeira. Amor de reticência. Antes que você esqueça deste amor que é marca de nascença. Carimbo. Papel timbrado –firma reconhecida feito amor de advogado.Entendi, é amor de papel passado (mal passado). Amor pingando sangue. Amor de derrame.Tanto esforço e o amor foi parar no hospital, paciente terminal. Lindo de ver morrer esse nosso amor. Os desertos da alma nunca são suficientemente secos...

domingo, 3 de outubro de 2010

O despertador


Antes eu achava que o cabo usb era a coisa mais legal criada nos últimos tempos. Super bacana poder descarregar fotos e esquentar o leite pela mesma tecnologia, era o que eu pensava. Agora que eu sou uma pessoa que acorda cedo, muito cedo, muito mais cedo do que eu gostaria, eu mudei de opinião. A coisa mais legal criada nos últimos tempos é o celular com mp3.


Há quem possar dizer que eu estou uns bons anos atrasada de assunto, mas como eu disse, acordar cedo é algo novo na minha vida. Antes eu acordava naturalmente, lá pelas 10 da manhã. E você, que já é mais calejado e acorda cedo faz tempo, pode até não se lembrar, mas até pouco tempo atrás seu despertador era um relógio de corda, que mais parecia um panelaço na sua cabeça, ou no muito aqueles de pilha que tocavam um pipipipi irritante. Ok, tinha o rádio-relógio que podia ligar o o rádio na hora de acordar, mas pense bem, acordar ouvindo Justin Bieber?

Pois é, ai que está o x da questão. Com o celular com mp3 você escolhe com qual música pode acordar, e pra mim, está ai a chave do bom humor. Sério. Escolher a música certa é fundamental pro dia começar bem. E não pense que é tarefa fácil, pois não é qualquer música que serve.


Comecei com aquela música tema do Rock Balboa, achei que me daria um pique legal pra começar o treino, ou melhor, o dia, mas não. Comecei a me sentir muito pressionada, logo assim pela manhça. Troquei por Chove Chuva, do Jorge Ben, porque eu gosto muito daquele introdução, mas não deu certo também. Dava uma vontade de ficar na cama, como se realmente chovesse lá fora, sabe? Então mudei para Mistério do Planeta, dos Novos Bahianos, mas é uma música que me faz pensar, e não, não deu certo ficar refletindo sobre a vida. É preciso pressa, menina!


Foi viajando que eu tive a sacada de colocar Maricotinha, do Caymmi. Olha, poucas músicas no mundo me trazem essa paz. Estou lá, ouvindo uma longa lista de músicas, mas quando toca Maricotinha acontece alguma coisa dentro de mim. É tão simples, tão gostosa.
E lá foi a Maricotinha me acordar todo dia cedo. Até semana passada. Fiquei com medo de começar a pegar birra da música. Quero que ela continue no hall das músicas amadas. Troquei pela versão de Hebbie Jibbie com as Puppini Sister, só porque me lembra o desenho Tico e Teco e me dá vontade de rir.

sábado, 2 de outubro de 2010

Como morrer na internet

Preciso dizer, antes de mais nada, que o texto abaixo foi publicado no meu blog no dia 28 de novembro de 2008, às 13:57. E é justamente nesse momento que você pensa o seguinte: “preguiçoso, esse cara, só escreveu três artigos inéditos no Blog das 30 pessoas e a sua quarta aparição já é uma cópia, assim não dá”.

Te entendo perfeitamente, você tem toda razão e aqui vão as minhas sinceras desculpas públicas: “o próximo será inédito".

Bom, passado esse momento de acusações e defesas públicas, gostaria de salientar que o artigo “Como morrer na internet” me parece bastante pertinente para a vida de todos nós que estamos aqui nesse momento lindo, sugados, dominados, corrompidos e para sempre amaldiçoados pelo monstro do lago Net.

Além do seu conteúdo peculiar e relevante, acredito que no Blog das 30 Pessoas o artigo terá uma exposição muito mais digna do que a familiar, amical e colegial (relativo a colegas, ok, eu sei que ficou tosco) obtidas no Blog do Paulo Pilha.

Obs.: Por uma questão “histórica”, o conteúdo do texto é exatamente o mesmo. Não foi feito qualquer tipo de revisão.


COMO MORRER NA INTERNET

Fulano de Souza criou um perfil no Orkut e em poucos meses abocanhou mais de 400 amigos. Eram colegas de primário, do cursinho de inglês, da aula de natação, familiares distantes, enfim, gente de todos os lugares possíveis e inimagináveis. Empolgado com este novo mundo virtual, criou um MySpace para divulgar suas canções peculiares – uma mistura de rock dos anos 80, com frevo, maracatu “e um tiquinho assim, desse tamaninho assim, de carimbó” (trecho em aspas, utilizado sem permissão, pode ser visto no vídeo “Também Sou Hype – Hermes e Renato”, que está no YouTube).

Muitos europeus se interessaram pelo seu trabalho e ele acumulou vários fãs e amigos, sobretudo na Alemanha e na Finlândia. Alguns videoclipes de suas músicas, produzidos por amigos cineastas, fizeram muito sucesso no YouTube e Fulano de Souza conseguiu agendar uma turnê na Europa, passando por Itália, França, Espanha, Bélgica, Portugal, e como não poderia deixar de faltar, Alemanha e Finlândia.

Acontece que duas semanas antes do embarque ele foi atropelado e morreu a caminho do hospital. Os comentários no MySpace, no YouTube e no Orkut continuaram normalmente porque nenhum de seus familiares ou amigos mais próximos sabiam as senhas do rapaz. E agora? Deixar um scrap no Orkut dele comunicando o triste episódio para que todos os seus amigos vejam? E quem vai acreditar? Quantos vão ver? Fulano de Souza estava morto no Plano Real, mas no Plano Cruzado, ou melhor, no Plano Virtual, estava mais vivo do que nunca – 5 solicitações de amigos pendentes no Orkut e mais 12 novos comentários no MySpace.

Para resolver este problema, Fulano de Souza pode fornecer as suas senhas para um amigão do peito que por sua vez poderá espalhar a notícia da sua morte no MySpace, no Fotolog, no Msn ou em qualquer outro site de relacionamento. Mas Fulano de Souza teria coragem de dar as suas senhas a ele ou a qualquer outra pessoa? E o amigão do peito? Teria ele coragem de fazer esse serviço para depois ficar respondendo mensagens em inglês da Europa de fãs enlouquecidos? E se o amigão do peito morrer antes do Fulano de Souza?

Nunca foi tão difícil morrer na internet como nos dias de hoje, pois nunca tivemos tantos sites de relacionamento. Mas acredite, tenho a solução! Criei um novo serviço na internet chamado MySpaceInHeaven. Funciona da seguinte forma, em 5 etapas:
1. O usuário se cadastra no MySpaceInHeaven com login e senha, como se estivesse criando uma nova conta de e-mail, ou seja, um procedimento muito simples e rápido.

2. Ele então preenche um campo listando 8 e-mails de pessoas da sua confiança. Não é necessário divulgar o nome dessas 8 pessoas.

3. Agora ele fornece login e senha de todos os sites de relacionamento que tem conta (Orkut, Facebook, MySpace, Fotolog, etc) ou deseja informar.

4. O contato com o MySpaceInHeaven por parte de qualquer um dos e-mails cadastrados só pode e deve ser feito quando o usuário morrer. Para tanto, é preciso enviar escaneado por e-mail uma cópia da certidão de óbito do usuário. Somente os 8 e-mails cadastrados podem fornecer a certidão de óbito. Porém, o usuário pode alterar estes e-mails a qualquer momento (enquanto estiver vivo, logicamente).

5. No momento em que o MySpaceInHeaven confirmar a morte do usuário (uma série de medidas são tomadas para garantir que a certidão enviada é de fato verdadeira), o próprio serviço se encarrega de espalhar a triste notícia para todos os sites de relacionamento que o usuário cadastrou na etapa número 3.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

- O MySpaceInHeaven não fornece as senhas do usuário morto para ninguém, nem para os e-mails cadastrados. Estas são automaticamente deletadas após o cumprimento da etapa número 5.

- O MySpaceInHeaven possui um sistema altamente moderno e seguro que só permite a visualização das senhas fornecidas pelo usuário quando a sua certidão de óbito for aprovada. Sendo assim, o usuário não precisa se preocupar, pois os funcionários do MySpaceInHeaven só poderão fuxicá-lo quando ele estiver morto e ainda assim, terão de ser rápidos, pois a senha só fica disponível por 2 horas. Depois de muitos estudos, o MySpaceInHeaven concluiu que 2 horas é um tempo mais do que suficiente para fazer o serviço completo (notificar todos os amigos do usuário pela internet), mesmo que o usuário tenha 10 sites de relacionamento com 5 perfis em cada – o máximo permitido na opção paga (R$2,00). Na opção gratuita, o usuário só pode cadastrar 5 sites de relacionamento com um perfil para cada.

- Os sites de relacionamento cadastrados ficam no ar somente por mais 30 dias úteis, a contar do dia em que a mensagem de óbito foi enviada, sendo depois dessa data automaticamente excluídos. Porém, o usuário pode escolher um site de relacionamento que fique no ar para sempre ou por quantos meses ele desejar. Caso ele queira que outro site de relacionamento fique mais de um mês no ar ou para sempre, ele precisa pagar uma taxa de R$ 1,00 para cada um.

- O MySpaceInHeaven não lê ou responde qualquer mensagem, scrap, depoimento, comentário e ignora todas as cantadas virtuais enviadas para o usuário morto.
- Pagando apenas R$ 3,00 o usuário pode desenvolver junto com o MySpaceInHeaven uma mensagem de óbito personalizada com cores, ilustrações e animações. Na opção gratuita, o MySpaceInHeaven envia um comunicado padronizado, onde troca apenas o nome do usuário.

- Informações sobre missa de sétima dia fornecidas por algum dos 8 e-mails cadastrados só serão aceitas caso enviadas no mesmo e-mail contendo a certidão de óbito escaneada. A opção gratuita não trabalha com informações sobre missa de sétimo dia. É preciso desembolsar R$ 2,00 para ter este serviço. O MyspaceInHeaven não se responsabiliza por qualquer informação referente a missas posteriores a essa data, inclusive de trigésimo dia.

- Se o usuário pagar mais R$ 2,00, ele ainda pode criar um material para memórias póstumas em formato PDF (os seus amigos teriam a opção de imprimir ao receberem por e-mail) que poderá conter suas poesias secretas, esconderijos de artigos valiosos, coleção de gibis, seu diário ou alguns trechos podem ser revelados neste material, enfim, pode ser qualquer coisa, cabe ao usuário definir. (Autor desta idéia – Pedro Arcanjo)

- O MySpaceInHeaven também será muito útil para as pessoas encontrarem mortos. Basta fazer uma rápida busca interna no site. Se o nome citado não for encontrado, significa que a pessoa está viva ainda. (Autora da idéia – minha mãe)

Algum nerd da informática quer comprar o meu produto? Vendo os direitos autorais por apenas R$ 999,99 e fico com 3% dos lucros trimestrais.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

post para uma pessoa imbecil

"e de repente tudo muda. aquela pessoa que eu conheci há pouco tempo e achava interessante na verdade é uma babaca. suas promessas tentadoras, bonitas e mentirosas naufragaram. sua insistência em me manter por perto desde aquele primeiro encontro era apenas uma necessidade de suprir sua carência. idiota. todas aquelas coisas que comprou pra mim eram na verdade uma desculpa pra me comprar. mas não deu certo, né? e agora que você percebeu que não me compra e que não dou a mínima pro seu carrão ou pro seu mega apê ou pra suas empresas, você começa a me desprezar... tsc tsc tsc. é tão triste isso. triste pra mim e triste pra você, que nem merecia um post. mas como eu gosto de registrar as coisas e não sou egoísta (nem tenho sua excentricidade) escolhi este blog (que você lê) pra dizer (o que você já sabe).

você é uma pessoa ESCROTA.

e pra comemorar o fim que se aproxima, te dedico o novo clipe do thunderbird (que você vai odiar) - eu não gosto mais de você!

beijos,"

victor franco